O Desembargador Jomar Ricardo Saunders Fernandes, do Tribunal de Justiça do Amazonas, em exame de recurso em sentido estrito contra sentença de pronúncia que determinou a ida de José Roberto Fernandes Barbosa ao Tribunal do Júri, para julgamento, concluiu pela inexistência da nulidade processual argumentada pela defesa do réu que sustentou que não foi oportunizado conversa prévia com advogado antes da ouvida do acusado em juízo.
Na sentença recorrida há outros réus, também pronunciados, dentre eles Gelson Carnaúba, por fato crime ocorrido no dia 01 de janeiro de 2017, no Compaj, em Manaus, na condição de membros da facção criminosa FDN e que teriam eliminado os também membros de facção rival – do PCC- e outros internos denominados ‘indesejáveis’.
José Roberto Fernandes Barbosa foi pronunciado pela suposta prática de homicídio qualificado, por 56 vezes, vilipêndio à cadáver, por 46 vezes e organização criminosa, crimes tipificados no código penal e na lei 12.850/2013. Pronunciado, não se conformando com a acolhida da pretensão do Ministério Público de levá-lo a júri, recorreu da decisão, com a subida dos autos ao Tribunal de Justiça. Alegou nulidade dos atos instrutórios, por falta de oportunidade de conversar previamente com a defesa.
Pediu, também, concomitantemente, que fosse despronunciado, sob o fundamento de que, na data do fato, estava custodiado em presídio de segurança máxima, portanto, distante do lugar e do momento da ocorrência da chacina. A preliminar de nulidade foi rejeitada por se considerar que o prejuízo alegado não restou demonstrado. Destacou-se que, sem prejuízo, não há nulidades. A inexistência de defesa técnica se constitui em nulidade absoluta, mas sua deficiência é nulidade relativa, que exige a efetiva demonstração do prejuízo alegado.
Concluiu-se no julgado que, embora tenha indicado a nulidade consubstanciada na ausência de conversa prévia com seus advogados, não especificou em que ponto tal providência teria violado as garantias processuais da defesa que o tenha prejudicado. Quanto ao pedido de despronúncia, o acórdão aborda que bastam indícios de autoria e materialidade, o que havia nos autos. Possibilitou-se aferir dos autos que José Roberto fazia parte da cúpula da facção criminosa FDN, Família do Norte, juntamente com os corréus Gelson Lima Carnaúba, o Mano G, e João Pinto Carioca, alcunhado de João Branco ou JB ou ‘Potência Máxima’. Assim, se concluiu que José Roberto Fernandes Barbosa, conhecido como ‘Zé Roberto’ da Compensa, foi um dos mentores intelectuais da chacina que ordenou o massacre no Compaj ocorrida em 01 de janeiro de 2017, isto para ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, que dará a palavra final.
Processo nº 0206218-06.2022.8.04.0001
Leia o acórdão:
Autos nº: 0206218-06.2022.8.04.0001Foro: Tribunal de Justiça. Relator: Jomar Ricardo Saunders Fernandes. Revisor: Revisor do processo Não informado EMENTA: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO (56 VEZES), HOMICÍDIO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA (06 VEZES), VILIPÊNDIO DE CADÁVER (46 VEZES) E TORTURA (26 VEZES). SENTENÇA DE PRONÚNCIA. TESE PRELIMINAR. NULIDADE POR AUSÊNCIA DE CONVERSA PRÉVIA ENTRE ADVOGADO E ACUSADO. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DO PAS DE NULLITE SANS GRIEF. PRONÚNCIA DO RÉU. PROVAS DE MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA DELITUOSA. EVENTUAL DÚVIDA QUE DEVERÁ SER DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DO JÚRI. RECURSO NÃO PROVIDO.1. Segundo a jurisprudência dos Tribunais Superiores, tanto nos casos de nulidade relativa como nos de nulidade absoluta, aplica-se o princípio pas de nullité sans grief, sendo imprescindível a efetiva demonstração de prejuízo da defesa para declaração de nulidade do ato, o que não verifi ca na espécie.2. O recorrente suscita a nulidade dos atos de instrução processual, sob o argumento de que não foi oportunizada conversa prévia com advogado antes de sua oitiva em juízo. Todavia, inexiste comprovação de prejuízo ao exercício da defesa técnica, razão pela qual a tese preliminar não merece acolhimento. 3. Tratando-se de crime doloso contra a vida e presentes indícios de autoria e provas de materialidade do delito, a sentença de pronúncia é a solução jurídica que se impõe, cabendo ao Tribunal do Júri dirimir eventuais dúvidas acerca dos fatos, mediante o exame aprofundado das provas produzidas. Assim, não se exige prova robusta da autoria delitiva na fase do judicium accusationis, bastando a existência de indícios de autoria delitiva para prosseguimento da ação penal na segunda etapa do procedimento escalonado do Júri. 4. Na hipótese, o arcabouço probatório, em especial os depoimentos testemunhais, coletados na fase inquisitorial e em juízo, constituem elementos de convicção ufi cientes para subsidiar a decisão recorrida, não havendo que se falar em improcedência da acusação.5. Ademais, importa destacar que, segundo apurado, o recorrente, vulgo “Zé Roberto da Compensa”, foi um dos mentores intelectuais do evento conhecido como massacre do COMPAJ, supostamente motivado por disputa entre facções criminosas rivais.6. Recurso não provido. acórdão Vistos, relatados e discutidos os autos do Recurso Em Sentido Estrito nº 0206218-06.2022.8.04.0001, em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Excelentíssimos Desembargadores que compõem a Segunda Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, por unanimidade de votos, e em consonância com o parecer do Graduado Órgão Ministerial, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do relator, que acompanha a presente decisão, dela fazendo parte integrante.