Responsabilidade objetiva de instituição financeira de grande porte e a inversão do ônus da prova em proveito do consumidor hipossuficiente são temas que permeiam julgados do Tribunal do Amazonas onde, ao ser comprovada a cobrança de juros desproporcionais pelos bancos, tem utilizado como parâmetro o Código de Defesa do Consumidor, sendo a base jurídica para a solução de controvérsias em empréstimos irregulares, tal como avaliado pela Desembargadora Maria das Graças Pessôa Figueiredo, ao rejeitar recurso da Crefisa contra ação julgada procedente a favor de Marcos Silva, que noticiou ter sofrido ilícito em contrato, acima da média do Banco Central.
Nas relações consumeristas é presumida a vulnerabilidade do adquirente do produto, mormente em contratos de financiamento, especialmente porque o próprio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que as taxas definidas pelo Banco Central se constituem apenas em parâmetro, às quais não estão sujeitas as instituições financeiras.
No julgado em que foi recorrente a Crefisa, o banco não se conformou com condenação por ter abuso contra o consumidor reconhecido em contrato de empréstimo, além de danos morais obrigado a indenizar. No vetor jurídico contrário ao alegado pelo Banco, o julgado concluiu que houve a prática de informações inadequados na relação com o cliente, autor no processo.
Não se informou ao consumidor os risco particulares envolvidos na operação financeira, pois somente fora feita a previsão de taxas de juros mensais e anuais, e tampouco se demonstrou qual a situação de risco que o consumidor, na espécie, representava, para a prática de taxas mais elevadas, acima da média definida, sobressaindo-se irregularidade e desproporcionalidade. Ou seja, o banco não demonstrou como o perfil do consumidor possuía alguma particularidade que pudesse influenciar negativamente no percentual de juros remuneratórios acima da media. O recurso foi rejeitado e mantida a condenação.
Processo nº 0002312-30.2017.8.04.4701
Leia o acórdão:
Processo: 0002312-30.2017.8.04.4701 – Apelação Cível. Apelante : Crefi sa S/A – Credito, Financiamento e Investimento. Apelado : Marcos Amaral da Silva. Relator: Maria das Graças Pessoa Figueiredo. EMENTA: CIVIL. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR. EMPRÉSTIMO PESSOAL. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. NÃO COMPROVAÇÃO DA REGULARIDADE DAS TAXAS DE JUROS ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO. ÔNUS DA PROVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA CARACTERIZADA. DEVER DE INDENIZAR. REEMBOLSO DOS VALORES DE FORMA DOBRADA. CONFIGURAÇÃO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS E MANTIDOS. RECURSO NÃO PROVIDO.1. Este caso decorre de uma relação de consumo, pois o Apelado é consumidor e a Apelante é fornecedora de produtos/serviços, incidindo, portanto, a súmula 297 do STJ, devendo ser presumida a vulnerabilidade da parte, eis que a instituição financeira de grande porte possui chances e condições muito maiores de se defender em litígios como o presente, de modo que a responsabilidade civil da Apelante é objetiva, bem como o ônus da prova se inverte em virtude da própria lei (ope legis). 2. A matéria tratada in casu não apresenta novidades, haja vista que o Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento afetado ao sistema de precedentes, deliberou sobre a questão, tendo sido proferido voto no REsp n.º 1061530/RS, no sentido de que o referencial disponibilizado pelo Banco Central é apenas um parâmetro, ou seja, a despeito de não haver a sujeição das instituições financeiras a taxas preestabelecidas, certo é que os valores cobrados devem respeito à proporcionalidade e à razoabilidade, de forma que, se os montantes forem exagerados, caberá a redução para a média do mercado para aquele período.3. Examinando com cautela o instrumento contratual, vislumbra-se que as informações são inadequadas,
visto que não há qualquer especificação acerca dos riscos particulares envolvidos naquela operação, mas somente a previsão das taxas de juros mensais e anuais, não havendo a demonstração adequada ao caso concreto do cotejo das condições pessoais do consumidor e os eventuais riscos na concessão do mútuo.4. Ou seja, muito embora defenda a instituição financeira que a taxa média não pode ser utilizada como parâmetro, por não distinguir o nível de risco de cada cliente, o próprio Apelante em momento algum comprovou que o perfil do Apelado possuiria alguma particularidade que pudesse influenciar negativamente no percentual de juros remuneratórios aplicado especificamente, ônus este que lhe competia, sob pena de tornar verdadeira a alegação do consumidor e impossibilitar a majoração da cobrança.5. Não havendo a desconstituição do direito do consumidor e nem prova da possibilidade de cobrança de taxas acima da média de mercado, erige a responsabilidade objetiva da instituição fi nanceira, devendo ser reparados os danos causados, com a devolução das quantias cobradas em dobro, posto que não configurada a hipótese de engano justificável. 6. Situação que extrapola os limites da boa-fé objetiva, caracterizando em ofensa à dignidade da pessoa humana e à honra do Apelado, devendo ser compensados os danos morais arbitrados na instância a quo, cujo valor, a saber, R$ 5.000,00 (cinco mil reais) é razoável e proporcional ao caso dos autos.7. Apelação conhecida e não provida