O centro da questão discutida nos autos cingiu-se em saber se a Resolução n° 076/2019, da Amazonas Energia, que revogou a norma interna DG-GP-01/N-031, teria o efeito de afastar as diretrizes previstas na referida norma interna da Reclamada relativas à dispensa sem justa causa de seus trabalhadores e se houve ou não repercussão jurídica no contrato de trabalho do Autor em decorrência da privatização sofrida pela concessionária.
É que as cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.
A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (TRT-11) rejeitou preliminares de nulidade da sentença e manteve a decisão que reconheceu a nulidade da dispensa de um trabalhador pela Amazonas Energia, entendendo que houve alteração contratual lesiva e incorporação de direito ao contrato de trabalho.
A decisão colegiada teve como relator o desembargador José Dantas de Góes, no julgamento do Recurso Ordinário interposto pela reclamada no processo nº 0000038-64.2022.5.11.0501, disponibilizado no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho em 16 de março de 2025.
No recurso, a empresa alegou diversas preliminares, incluindo julgamento extra petita, negativa de prestação jurisdicional e necessidade de suspensão do feito até o julgamento definitivo do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) nº 0000233-34.2021.5.11.0000, que trata do Tema 1.022 de repercussão geral.
A reclamada sustentou que o julgamento do IRDR pelo TRT-11 não observou o quórum regimental e, por isso, a tese firmada não teria caráter vinculante. Alegou ainda que a norma interna supostamente descumprida não teria sido incorporada ao contrato de trabalho do obreiro, de modo que a dispensa não careceria de motivação.
O colegiado, no entanto, entendeu que não houve vícios processuais na sentença de primeiro grau. A 3ª Turma ressaltou que a concessão de tutela antecipada, por si só, não configura julgamento fora dos limites do pedido (extra petita), e que a prestação jurisdicional foi devidamente entregue, com análise dos pontos controvertidos.
Quanto à alegação de ausência de quórum no julgamento do IRDR, a Turma destacou que eventuais irregularidades nessa esfera devem ser discutidas nos autos próprios, não cabendo à reclamada desconsiderar os efeitos vinculantes da tese firmada enquanto não houver decisão definitiva do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Sobre o mérito, os magistrados mantiveram o entendimento de que houve alteração contratual lesiva e que a norma interna da empresa — aplicada reiteradamente — incorporou-se ao contrato de trabalho, gerando direito adquirido ao trabalhador. Com isso, a dispensa foi considerada nula, por ausência de motivação válida para o rompimento do vínculo empregatício. Ainda, foi indeferido o pedido da empresa para revogação dos benefícios da Justiça Gratuita concedidos ao reclamante.
A Turma também levou em conta que, embora o TST tenha determinado a suspensão dos efeitos do acórdão proferido no IRDR, tal decisão não impede a aplicação da tese firmada enquanto vigente. Nesse sentido, a suspensão do feito foi indeferida, e o recurso da reclamada, integralmente desprovido.
Com a decisão, o TRT-11 reafirma a força normativa dos IRDRs enquanto não forem suspensos por decisão judicial com efeitos abrangentes, além de reconhecer a proteção ao direito adquirido dos trabalhadores frente a práticas reiteradas e normas internas da empresa.
Processo: 0000038-64.2022.5.11.0501/ Publicado em 16/03/2025 – Órgão Julgador Colegiado: 3ª Turma; Relator(a): JOSE DANTAS DE GOES