Transtornos sonoros questionados por vizinhança não são resolvidos na Vara Ambiental

Transtornos sonoros questionados por vizinhança não são resolvidos na Vara Ambiental

A proximidade das elementares que definem alguns delitos pode dar azo a decisões entre juízos criminais diversos, com o surgimento de declínios de competência, mas não se sustenta o entendimento de que o crime de poluição sonora possa ser revelado quando a notícia do fato encaminhada ao Juizado Especial Criminal relata apenas gritarias e algazarras associado a barulhos de instrumentos sonoros ou grunhidos de animais de estimação ouvidos da casa vizinha.  

Com esse enfoque a Desembargadora Carla Maria dos Reis, do TJAM, dirimiu conflito de competência entre a Vara do Meio Ambiente e o Juizado Especial Criminal. No Termo de Ocorrência  que deu origem ao conflito, a vítima narrou que o vizinho perturbava com algazarras, além do barulho insuportável de animais. O Juízo entendeu que a capitulação da autoridade policial por perturbação do sossego se encontrava incorreta. Não seria perturbação do sossego alheio, mas sim o crime de poluição sonora da lei ambiental. 

Por não aceitar a nova classificação jurídica, a Vara do Meio Ambiente suscitou o conflito negativo de competência, que foi examinado no TJAM. Os autos retornaram ao Juizado Especial Criminal, por ser o juízo natural da causa, como decidido em segunda grau. A diferença está entre a proteção jurídica reclamada pelo sossego social e aquela que exige a tutela do meio ambiente. Sem dúvida, foi a primeira hipótese a examinada nos autos, deliberou a decisão. 

Se o barulho excessivo causa apenas a ruptura do sossego alheio, com a quebra da tranquilidade habitual, ainda que produzido por gritaria ou algazarra, ou até instrumentos sonoros ou por animais sob a guarda dos tutores, a hipótese é de uma contravenção penal, como disposto no artigo 42 da LCP. Não havendo indícios de que o barulho seja potencialmente ofensivo a integridade física ou psíquica do ser humano ou cause a mortandade de animais ou devaste a flora, não há como os fatos serem albergados pelo crime de poluição sonora descrito na lei dos crimes ambientais. 

Processo 042678-04.2023.8.04.0001

Leia o acórdão:

Classe/Assunto: Conflito de competência cível / Efeitos Relator(a): Carla Maria Santos dos Reis Comarca: Manaus Órgão julgador: Câmaras Reunidas Data do julgamento: 24/08/2023Data de publicação: 24/08/2023. Classe/Assunto: Conflito de competência cível / Efeitos Relator(a): Carla Maria Santos dos Reis Comarca: Manaus Órgão julgador: Câmaras Reunidas Data do julgamento: 24/08/2023Data de publicação: 24/08/2023Ementa: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL E JUÍZO ESPECIALIZADO DO MEIO AMBIENTE. DELITO DE PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO. BEM JURÍDICO TUTELADO PAZ SOCIAL. REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA COMUM. ART. 66, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 9.099/95. PRECEDENTES. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. 1. O Crime de poluição sonora, previsto no art. 54 da Lei 9.605/98, compreende a poluição de qualquer natureza que possa causar danos à saúde humana ou à de animais, bem como a destruição da flora, cuja caracterização depende de laudo técnico comprovando a possibilidade de prejuízos à saúde e à qualidade de vida com a frequência da exposição. 2. Por sua vez, a contravenção definida no artigo 42 do Decreto Lei n. 3.688, conhecido como Lei de Contravenções Penais, relaciona-se com a perturbação de alguém, tanto o trabalho quanto o sossego alheio – com gritaria ou algazarra, de forma ruidosa, abusando de instrumentos sonoros ou provocando barulho com animais de estimação, que, ao que tudo indica, é o caso dos autos. 3. Da narrativa constante nas peças investigatórias delineia-se que o objeto a ser protegido é o sossego social e não o meio ambiente. Isso porque, da leitura das declarações constantes do procedimento investigatório, infere-se que a questão tratada está relacionada com a perturbação do sossego da vítima, que afirmou que o acusado estaria com som alto e gritaria no período de 30/12/2022 a 01/01/2023. 4. Nesse aspecto, sublinha inserir relevante artigo sobre Poluição Sonora e Perturbação do Sossego sob a Perspectiva do Ordenamento Legal, de autoria de Katia Machado de Medeiros e Diego de Farias Lima: “(…) O bem jurídico tutelado pelo art. 42 da Lei das Contravenções Penais é o sossego e a tranquilidade para trabalhar de qualquer cidadão. No art. 54 o que se visa proteger é a saúde humana, e a vida animal e vegetal. Logo, não há de se confundir o âmbito de aplicação das duas normas. Todo som excessivo que venha a causar apenas ruptura do sossego alheio e inconveniente no exercício de suas funções habituais, e que seja produzido por gritaria, algazarra, instrumento profissional em desrespeito às prescrições legais, instrumentos sonoros ou sinais acústicos, ou por animal de que é o infrator responsável, causa a aplicabilidade da norma contravencional. Entretanto, se este barulho produzido potencialmente puder ofender a integridade física ou psíquica de qualquer ser humano, ou causar a mortandade de animais ou devastação significativa da flora, estar-se-á diante de poluição sonora e aplicável será a norma protetiva do art. 54. Ambas as normas possuem âmbito de incidência diferenciado (…). 5. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Suscitado da 15ª Vara do Juizado Especial Criminal da Comarca de Manaus/AM.

Leia matéria correlata no seguinte link:

Linha tênue entre a perturbação e a poluição sonora se desfaz entre bens jurídicos diversos

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