Uma trabalhadora doméstica de 76 anos foi resgatada de situação análoga à de escravidão, em Copacabana, Rio de Janeiro, após mais de 50 anos de trabalho doméstico. A vítima começou a trabalhar na residência em 1969, quando tinha 22 anos, e desde então prestava serviços domésticos sem que se tenha notícia de pagamento de remuneração e sem outros direitos elementares, como férias.
O MPT-RJ recebeu denúncia anônima e acionou o Poder Judiciário para inspecionar o local. A primeira tentativa de inspeção na residência foi negada pela primeira instância da Justiça do Trabalho. Segundo o juiz responsável, não havia elementos suficientes para autorizar a medida. Ele pontuou que em casos similares não se concluiu pelo resgate e “ficaram os danos psicológicos sofridos pelos envolvidos, que tiveram seu lar [e] sua vida privada, violados”.
Após recurso do Ministério Público do Trabalho (MPT) ao Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, a segunda instância da Justiça Trabalhista autorizou a fiscalização. A Juíza Convocada relatora afirmou que a relevância da denúncia “não nos permite ignorar a possibilidade de manutenção de trabalhadora com condições de trabalho forçado ou similar à escravidão” e que “não se pode ter tratos com a barbárie”.
Com a autorização judicial obtida em segundo grau foi realizada a primeira fiscalização pela Auditoria-Fiscal do Trabalho e pelo Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) e, após outras diligências complementares, concluiu-se que de fato a trabalhadora era explorada em condições análogas à escravidão.
A vítima idosa prestava serviços domésticos na residência e não recebia salário. Embora alegassem que ela seria pessoa “da família”, a investigação descobriu que ela foi identificada como “babá” na escola na qual estudava integrante da família dos empregadores.
Segundo o procurador Thiago Gurjão, que conduziu o caso pelo MPT, “tem-se verdadeira situação de trabalho forçado, com abuso de vulnerabilidade, de trabalhadora que permaneceu prestando serviços domésticos sem remuneração, em troca de um lugar para dormir, alimentação e outros supostos “benefícios” que não a permitiam ter autonomia de vida, sendo tratada apenas como um mero objeto, um “anexo” da família e não uma pessoa humana, que deve existir e viver tomando suas próprias decisões sobre seus desígnios de vida, exercendo sua autodeterminação”.
Para Raul Capparelli, Auditor-Fiscal do Trabalho que atuou no caso pela SRTE, “a empregada mostrou-se desde sempre grata, entendendo que sua função era ali servir durante todos os dias da semana. Não havia referência de um trabalho decente, seja sobre a ótica do que deveria ter de direitos reconhecidos, seja pelo olhar de como deveria ser tratada pela família empregadora”.
A partir da conclusão da investigação conjunta, a Auditoria-Fiscal do Trabalho promoveu o resgate da trabalhadora, lavrou sete autos de infração e emitiu guia de seguro-desemprego da trabalhadora resgatada. Após tratativas, a empregadora firmou termo de ajustamento de conduta (TAC) com o MPT, garantindo o reconhecimento do vínculo de emprego e pagamento das verbas trabalhistas e indenização por dano moral.
A vítima foi atendida pela equipe do Projeto Ação Integrada, mantido com recursos destinados pelo MPT-RJ.
Com informações do MPT