Em sessão ordinária realizada neste mês de agosto, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), decidiu, por maioria, dar provimento ao pedido de uniformização, fixando entendimento sobre a responsabilidade das instituições financeiras em casos de uso indevido de cartões de débito ou crédito por terceiros mediante fraude. O voto vencedor foi proferido pelo relator, juiz federal Caio Moysés de Lima, e o tema foi julgado como representativo de controvérsia (Tema 331).
A decisão da TNU estabelece que, em regra, o uso fraudulento de cartão de débito ou crédito por terceiros constitui fortuito interno, conforme a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), exceto quando comprovada culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, conforme o art. 14, § 3º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Em princípio, a utilização do cartão e da senha descaracteriza a responsabilidade do banco, pois configura quebra do dever contratual de cuidado do cliente. Contudo, a TNU ressaltou que a responsabilidade do banco não é afastada se houver fortes indícios de fraude detectáveis pela instituição ou se não for claramente demonstrado o descumprimento consciente, por parte do consumidor, do dever de cuidado no uso do cartão, especialmente em casos envolvendo fraude sofisticada ou consumidores hipervulneráveis.
O pedido de uniformização foi apresentado após uma cliente bancária ter perdido a ação nas instâncias inferiores. A 5ª Turma Recursal da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul havia afastado a responsabilidade da Caixa Econômica Federal, entendendo que a autora contribuiu para o ilícito ao compartilhar suas informações bancárias.
A requerente argumentou que a decisão estava em desacordo com a jurisprudência do STJ, citando o acórdão no Recurso Especial n. 1.995.458/SP, que reconhece a responsabilidade das instituições financeiras por não adotarem mecanismos eficazes para impedir operações fraudulentas.
No voto vencedor, o relator destacou a necessidade de avaliar a atuação das instituições financeiras em casos de fraudes bancárias, como no chamado “golpe do motoboy”, para verificar se houve falha na detecção de movimentações atípicas ou suspeitas. Ele ressaltou que a sofisticação das fraudes atuais, aliada à vulnerabilidade de alguns clientes, como idosos, exige uma revisão dos limites da responsabilidade dos bancos.
A Caixa Econômica Federal argumentou contra a afetação do tema como representativo de controvérsia e defendeu que a responsabilidade não deveria ser atribuída ao banco, salvo em situações excepcionais envolvendo consumidores hipervulneráveis. No entanto, a TNU entendeu que a responsabilidade do banco deve ser analisada com base no dever de segurança que lhe cabe, especialmente diante das possibilidades tecnológicas atuais de prevenção de fraudes.
Processo n. 5008761- 19.2020.4.04.7102/RS