Em sessão ordinária de julgamento realizada em 7/8, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) decidiu, por maioria, dar provimento ao pedido de uniformização, nos termos do voto do relator juiz federal Caio Moysés de Lima, julgando-o como representativo de controvérsia e fixando a seguinte tese:
“1. O uso indevido de cartão de débito ou crédito por terceiro, mediante fraude, constitui, em regra, fortuito interno para os fins da Súmula 479/STJ, salvo se comprovada culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, § 3º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor). 2. Em princípio, a realização de operação com o uso de cartão e senha descaracteriza a responsabilidade do banco por configurar quebra do dever contratual de cuidado do cliente. 3. Todavia, não se configura a excludente de responsabilidade se, independentemente de prévia comunicação da ocorrência pelo titular do cartão, (i) as circunstâncias em que as operações foram realizadas e o perfil do consumidor revelarem fortes indícios de fraude detectáveis pelo banco; ou (ii) não restar claramente demonstrado o descumprimento consciente, pelo consumidor, do dever contratual de cuidado no uso do cartão, seja em razão do grau de sofisticação dos meios de engenharia social empregados pelos fraudadores, seja pela condição de hipervulnerabilidade da vítima”. – Tema 331.
O pedido de uniformização foi apresentado após cliente bancária ter perdido a ação nas instâncias inferiores. A 5ª Turma Recursal da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul (RS) havia afastado a responsabilidade da Caixa Econômica Federal (CAIXA), entendendo que a própria autora contribuíra para o ilícito ao compartilhar suas informações bancárias.
A requerente argumentou que a decisão estava em desacordo com a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça (STJ), citando o acórdão proferido no Recurso Especial n. 1.995.458/SP, que reconhece a responsabilidade das instituições financeiras por não adotarem mecanismos eficazes para impedir operações fraudulentas.
Voto vencedor
O relator do processo na TNU, juiz federal Caio Moysés de Lima, defendeu que, em casos de fraudes bancárias, como as ocorridas no “golpe do motoboy”, é necessário avaliar se a instituição financeira deixou de verificar a autenticidade das movimentações atípicas ou suspeitas, o que pode configurar falha de segurança.
Ressaltou, ainda, a sofisticação das fraudes atuais, aliada à vulnerabilidade de alguns clientes, o que exige revisão dos limites da responsabilidade dos bancos: “A enorme sofisticação dos meios de engenharia social empregados torna mais difícil atribuir à vítima culpa exclusiva pela entrega da senha, em especial quando a fraude recai sobre pessoas mais vulneráveis, geralmente idosas”.
A Caixa Econômica Federal, em sua defesa, havia argumentado contra a afetação do tema como representativo de controvérsia, além de propor a tese de que a responsabilidade não deveria ser atribuída ao banco, salvo em situações excepcionais envolvendo consumidores hipervulneráveis. Contudo, a TNU entendeu que a responsabilidade do banco deve ser analisada à luz do dever de segurança que lhe cabe, especialmente diante das possibilidades tecnológicas atuais de prevenir fraudes.
Processo n. 5008761- 19.2020.4.04.7102/RS
Com informações do TRF-2