A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, aplicar o instituto da supressio para manter a rescisão de um contrato de compra e venda de lote e ordenar a devolução dos valores pagos por um casal desistente do negócio. O entendimento baseou-se na boa-fé objetiva e afastou a execução extrajudicial prevista na Lei nº 9.514/97, pois o registro do contrato só foi realizado pela empresa após o ajuizamento da ação.
O caso
O processo teve origem em uma ação proposta por um casal que desistiu de adquirir um terreno após ter pago um sinal e algumas parcelas, totalizando aproximadamente R$ 77 mil. Alegando incapacidade financeira para continuar o negócio, os autores ajuizaram ação de rescisão contratual pedindo a devolução do valor pago.
Em resposta, a empresa proprietária do imóvel, apenas depois de iniciada a ação, registrou o contrato de promessa de compra e venda na matrícula do imóvel e incluiu cláusula de alienação fiduciária, com o objetivo de atrair a aplicação da execução extrajudicial prevista na Lei nº 9.514/97.
Em primeira instância, o pedido de rescisão foi negado, e o casal foi condenado a arcar com despesas de IPTU, ITBI, escritura e registro do contrato.
Decisão do TJ-GO
Na apelação, o Tribunal de Justiça de Goiás reformou a sentença, concluindo que o registro tardio do contrato inviabilizou a constituição em mora dos autores. Assim, determinou a rescisão contratual e a devolução integral dos valores pagos, com fundamento no Código de Defesa do Consumidor (CDC), no Código Civil (CC) e na Súmula 543 do STJ, que regula a devolução de valores em contratos de promessa de compra e venda.
Fundamentos do STJ
Relatora do caso no STJ, a ministra Nancy Andrighi destacou que o instituto da supressio pressupõe a perda de um direito pela sua não utilização em tempo hábil, especialmente quando isso gera na parte contrária a legítima expectativa de que o direito não será exercido. Ela explicou que o registro tardio afronta o princípio da boa-fé objetiva, previsto no artigo 422 do Código Civil, que exige condutas leais e éticas entre as partes, afastando relações contratuais desequilibradas.
Segundo a ministra, não se pode admitir que contratos de promessa de compra e venda sejam submetidos ao critério ilimitado do alienante quanto ao momento de registro. “Diante do princípio da boa-fé objetiva e do instituto da supressio, é inviável permitir que o registro seja realizado apenas após o ajuizamento da ação para forçar a aplicação da execução extrajudicial”, concluiu.
Com base nesses fundamentos, o STJ manteve a decisão do TJ-GO, consolidando o entendimento de que o comportamento da empresa desrespeitou a confiança legítima dos autores e violou o equilíbrio contratual.