STM condena nora que casou com sogro major por fraude previdenciária

STM condena nora que casou com sogro major por fraude previdenciária

O Superior Tribunal Militar (STM) voltou a apreciar, nesta quinta-feira (15), mais uma ação penal envolvendo crime de fraude previdenciária, com prejuízo ao sistema de pensão do Exército Brasileiro.

Novamente, o caso envolve uma nora que se casou com seu sogro para herdar a pensão militar. Ela ficou 18 anos enganando a administração pública, causando prejuízos que somaram mais de R$ 5 milhões.

Conforme os autos, a denúncia foi oferecida em 4 de abril de 2022 pelo Ministério Público Militar à Justiça Militar da União, em Porto Alegre (RS), e narra que a ré, hoje com mais de 60 anos, contraiu matrimônio em outubro de 2002, firmado em cartório, com um major aposentado do Exército.

Na época, ela tinha 37 anos, e o idoso, 80. O aposentado era seu sogro e avô de seu filho.

Ainda segundo a promotoria, o único intuito das núpcias era a obtenção da pensão pela morte iminente do militar reformado, que já estava em estágio avançado de câncer de próstata. Exatamente um ano após o casamento, em 30 de outubro de 2003, o aposentado faleceu.

No mês seguinte, ela foi ao Comando do Exército, se apresentou como viúva e requereu a pensão militar deixada pelo major. Dali em diante, passou a receber mensalmente dos cofres públicos os valores integrais da pensão.

“Após 15 anos mantendo a administração militar em erro, em 2018, sobreveio notícia do fato ao MPF, comunicando que ela fora casada com o filho do major, também falecido, em junho de 1999, cerca de três anos antes de se casar com seu ex-sogro”, informou a promotoria na denúncia.

O laudo da perícia contábil calculou um prejuízo total de R$ 5.252.168,49, atualizado em 31 de outubro de 2021. Ela foi denunciada pelo delito de estelionato, previsto no Código Penal Militar.

No julgamento de primeira instância, em julho do ano passado, na Auditoria Militar de Porto Alegre (RS), a juíza federal da Justiça Militar, de forma monocrática, entendeu que havia uma certidão de casamento legalmente expedida por um cartório e, assim, não haveria fraude. Por isso, decidiu absolvê-la por “não existir prova suficiente para a condenação”.

Apelo

O Ministério Público Militar (MPM) ficou inconformado com a decisão e recorreu, em sede de apelação, junto ao Superior Tribunal Militar (STM), em Brasília.

Em suas razões de apelação, o MPM requereu a reforma da sentença para condenar a mulher, alegando a grande diferença de idade entre os nubentes, os diversos problemas de saúde enfrentados pelo instituidor da pensão militar e a divergência de endereços, demonstrando que o casamento era mera fachada para obtenção da pensão.

A defesa da ré também se pronunciou, pedindo a manutenção da sentença com base no princípio do “In Dubio Pro Reo”, apontando que o Ministério Público não conseguiu comprovar a existência de fraude na união celebrada entre o idoso e sua nora.

Ao apreciar o caso no STM, o ministro relator Artur Vidigal de Oliveira,  votou para manter a sentença de absolvição, que teve parecer favorável da Procuradoria- Geral da Justiça Militar, em razão da existência de documento que goza de presunção de veracidade, certidão de casamento lavrada no competente órgão – Cartório de Ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais da 1ª Zona de Porto Alegre/RS, em 19 de outubro de 2002.

O ministro alegou também que o Código de Processo Penal tem a devida previsão para resolver questões prejudiciais quanto ao estado civil da pessoa .

“Sendo assim, a Certidão de Casamento apresentada na Organização Militar, para obtenção de pensão, não poderia ser desconsiderada ou mesmo questionada na Justiça Militar, que não é competente para decretar a nulidade ou anulação de casamento, matéria de competência do juízo cível. Assim, considerando todo o arcabouço probatório e a não desconstituição do documento apresentado –Certidão de Casamento – não se pode acusar a Apelada de ter se casado de forma fraudulenta com o único propósito de iludir a Administração Militar”, votou o relator.

Voto de Vista 

O ministro Péricles Aurélio Lima de Queiroz pediu vista dos autos e mais tempo para estudar melhor o caso.

Nesta quinta-feira, o caso entrou em pauta e foi novamente analisado pelo Pleno do Tribunal. Em seu voto de vista, o ministro Péricles Queiroz teve entendimento divergente do relator, decidiu reverter a decisão de primeira instância e condenar a mulher por estelionato.

Segundo o magistrado, o Código Civil brasileiro proíbe o casamento entre nora e sogro.

“De início, observa-se a nulidade do casamento devido ao impedimento legal de celebração de matrimônio entre nora e sogro, segundo o art. 1.521, inciso II, do Código Civil. A vedação de matrimônio entre afins em linha reta decorre do parentesco firmado por casamento anterior. Assim, não é possível se casar com ‘ex-sogro’ ou ‘ex-sogra’. A regra se assemelha à proibição de casamento entre pais e filhos, sendo os sogros considerados pais por afinidade.”

Ele acrescentou também que, mesmo havendo a dissolução de casamento anterior, isso não é capaz de aniquilar o parentesco por afinidade na linha reta, ligação por ascendência ou descendência. “Permanece, portanto, a afinidade entre sogro e nora. Assim, inexiste ‘ex-sogro’ ou ‘ex-sogra’, expressões comuns em conversas informais, consoante art. 1.595, § 2º, do Código Civil.”

Para o ministro, a nulidade absoluta de um instituto jurídico, estabelecida sempre em lei, é essencial para a proteção dos interesses públicos e dos princípios fundamentais que regem a sociedade.

“A ineficácia do negócio jurídico se opera desde a sua origem, uma vez que é retroativa. Não é passível de convalidação, pois não dá margem para correção ou ratificação. Além disso, é imprescritível, porquanto não convalesce pelo decurso do tempo. Assim, a nulidade absoluta é uma ferramenta jurídica de grande relevância para o controle de legalidade e moralidade dos atos jurídicos, haja vista que ajuda os operadores do Direito a respeitarem as leis e princípios éticos fundamentais da sociedade em suas transações e acordos, bem como protege os indivíduos e o interesse público dos efeitos de ações ilegais ou imorais”.

Conforme o magistrado, ao se tratar de um casamento simulado entre parentes afins, o ato jurídico foi realizado exclusivamente para a fraude previdenciária.

“As núpcias foram contraídas apenas como aparência, sem que jamais fosse estabelecida a real comunhão matrimonial entre os envolvidos.”

Ele aplicou uma pena final de 3 anos e 3 meses de reclusão, em regime inicial aberto e com direito de recorrer em liberdade. Por maioria, os ministros do STM acolheram o voto de vista e condenaram a mulher por fraude previdenciária.

APELAÇÃO 7000854-76.2023.7.00.0000

Com informações do STM


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