As medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha são válidas enquanto perdurar a situação de perigo. E isso, por si só, impede a fixação de tempo de vigência. Pelo mesmo motivo, o juiz pode revisar periodicamente a necessidade de manutenção das cautelares, mas não cabe a ele estabelecer prazo genérico para que isso ocorra.
Essa foi a conclusão da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público de Minas Gerais para restabelecer medidas protetivas obtidas por uma mulher que foi ameaçada pelo ex-marido.
O acórdão se soma à jurisprudência que vem sendo construída pelo tribunal para garantir a efetividade de tais cautelares, especialmente nas situações em que a ocorrência de violência contra a mulher não evolui para denúncia.
O STJ tem entendido que as medidas protetivas têm caráter inibitório e não são acessórias de um processo principal. Logo, podem continuar existindo mesmo na hipótese de arquivamento do inquérito. E, ainda nesses casos, a revogação depende da oitiva prévia da vítima.
No caso enfrentado pela 6ª Turma, essas posições recentes não haviam sido observadas pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG). A corte estadual entendeu que a protetiva depende da ação principal e não pode ser um fim em si mesma.
A proibição de aproximação do ex-marido foi revogada porque não havia inquérito ou ação penal contra ele. Também pesou o fato de ter sido deferida há muito tempo, em 2017. Para o TJ-MG, seria perfeitamente possível que a situação já estivesse alterada.
Relatora da matéria, a ministra Laurita Vaz afirmou que não há na Lei Maria da Penha nenhuma indicação de que as protetivas de urgência têm natureza cautelar, o que significaria que elas deveriam estar atreladas a algum processo principal ou inquérito. Em vez disso, são inibitórias.
Logo, a única conclusão possível é que elas devem durar enquanto perdurar a situação de perigo. Isso faz com que perca sentido a discussão sobre a necessidade de fixar um prazo de vigência, pois é impossível saber de antemão quando o contato com o ex-marido deixará de causar insegurança.
A consequência é que a revogação de tais medidas exige que o juiz tenha a certeza de que houve a alteração do contexto fático e jurídico. Por isso, são necessárias a oitiva das partes e a instauração do contraditório, como já decidiu a 3ª Seção do STJ.
“Isso, por si só, impede a convalidação de decisões que simplesmente fixam um prazo determinado para as medidas protetivas (revogação automática), sem qualquer averiguação acerca da manutenção daquela situação de risco que justificou a imposição das medidas, expondo a mulher a novos ataques”, anotou a ministra.
“Igualmente, não pode ser admitida a revogação das medidas a partir do fundamento genérico de que o mero decurso do tempo enseja a presunção de que elas se tornaram desnecessárias, sem a prévia oitiva das partes envolvidas”, completou ela.
O voto destaca que, por outro lado, há certas medidas protetivas que podem causar limitação à liberdade do agressor, o que não pode durar eternamente. Assim, nada impede que o juiz revise periodicamente a necessidade de manutenção dessas medidas.
A ministra considerou descabida, no entanto, a fixação de um prazo genérico para reavaliação. Cabe ao juiz escolher período mais curto ou alongado, a depender do risco a que a vítima está submetida e da natureza mais ou menos restritiva das medidas aplicadas.
REsp 2.036.072
Com informações do Conjur