A Ministra Daniela Teixeira, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu habeas corpus de ofício para desclassificar a conduta de um acusado de tráfico de drogas para posse de entorpecente para consumo próprio, nos termos do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006).
Com isso, a condenação imposta pela Justiça do Amazonas foi anulada e restabelecida a sentença de primeiro grau. A decisão foi proferida no Habeas Corpus nº 983437/STJ e publicada no Diário da Justiça Eletrônico em março deste ano.
Fatos e fundamentação da decisão
O caso teve origem na Vara Única de Boca do Acre, no Amazonas, onde o Ministério Público denunciou o réu pelo crime de tráfico de drogas. No entanto, ao sentenciar, o Juiz Otávio Augusto Ferraro concluiu que não havia provas suficientes, para além da dúvida razoável, de que a substância (cocaína) apreendida era destinada ao comércio ilícito. Por outro lado, existiam elementos que indicavam o consumo próprio, levando à desclassificação da infração penal.
O Ministério Público recorreu, e o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) reformou a decisão, condenando o acusado pelo crime previsto no artigo 33, caput, da Lei de Drogas, na modalidade de tráfico privilegiado. Contra essa decisão, a defesa impetrou habeas corpus junto ao STJ, argumentando que não havia provas concretas para a condenação por tráfico.
A Ministra Daniela Teixeira, ao julgar monocraticamente o pedido, entendeu que a quantidade reduzida da droga apreendida, a ausência de balança de precisão, embalagens ou instrumentos usados na comercialização, e a inexistência de testemunhos que comprovassem o tráfico reforçavam a tese de uso pessoal.
Além disso, os policiais que realizaram a abordagem não presenciaram qualquer ato de venda e relataram apenas uma suposta confissão informal do acusado, sem que houvesse registro da garantia de seus direitos constitucionais, especialmente o de permanecer calado.
Decisão e impactos
Mesmo sem conhecer do habeas corpus substitutivo, o STJ concedeu a ordem de ofício, determinando a requalificação da conduta do acusado para o crime de posse de drogas para consumo pessoal, conforme o artigo 28 da Lei de Drogas. Dessa forma, foi restabelecida a sentença de primeiro grau que afastava a caracterização do tráfico.
A decisão evidencia a interpretação garantista adotada pelo STJ, aplicando os princípios da proporcionalidade e da individualização da pena. O entendimento reforça a necessidade de provas concretas para a configuração do tráfico de drogas e a impossibilidade de presumir a intenção de comercialização apenas com base em confissões informais ou suposições.
A determinação também impõe comunicação imediata ao TJAM e ao juízo de origem para o cumprimento da decisão, estabelecendo um precedente relevante na distinção entre usuários e traficantes dentro da jurisprudência do STJ.
HC 983437