É possível presumir a maternidade não biológica de uma criança gerada por inseminação artificial caseira no curso de uma união estável homoafetiva.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial para permitir que uma criança de dois anos tenha em seu registro de nascimento os nomes de duas mães.
O registro da dupla maternidade fora negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, por maioria de votos, devido à ausência de fundamento legal para o pedido — embora a corte estadual tenha precedente em sentido oposto.
Para permitir o registro, o STJ precisou dar aplicação análoga ao artigo 1.597 do Código Civil, que trata das hipóteses em que é possível presumir a maternidade do filho gerado na constância do casamento.
O inciso V diz que a presunção é cabível nos casos de inseminação artificial heteróloga, desde que exista prévia autorização do marido.
Já o Conselho Nacional de Justiça indica aos cartórios que, para o registro da certidão de nascimento de bebê gerado por reprodução assistida, é indispensável a declaração, com firma reconhecida, da clínica em que o procedimento foi feito.
A norma está no artigo 513, inciso II, do Provimento 149/2023, que estabeleceu o Código Nacional de Normas, que regulamenta os serviços notariais e de registro.
Nesse cenário, o casal homoafetivo composto por duas mulheres ficou sem opções, já que a inseminação artificial foi feita de maneira caseira e, portanto, não havia um documento considerado imprescindível para o registro.
Pode registrar
Relatora da matéria, a ministra Nancy Andrighi entendeu que é possível aplicar o artigo 1.597, inciso V, do Código Civil às uniões estáveis hétero e homoafetivas. Isso com base na equiparação promovida pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar a ADI 4.277 e a ADPF 132.
Quanto ao acompanhamento médico de clínicas especializadas em inseminação artificial, embora seja relevante para o planejamento familiar, não há no ordenamento jurídico brasileiro qualquer vedação ao registro de filho feito por inseminação caseira, segundo ela.
“Ao contrário”, desatacou a relatora, “a interpretação, à luz dos princípios que norteiam o livre panejamento familiar e o melhor interesse da criança, indica que a inseminação artificial caseira é protegida pelo ordenamento jurídico”.
Ao dar provimento ao recurso especial, o STJ autorizou o registro da maternidade presumida, dispensando a apresentação dos documentos exigidos no artigo 513, inciso II, do Provimento 149/2023 do CNJ. Atuou como amicus curiae no caso o Instituto Brasileiro do Direito de Família (IBDFAM).
REsp 2.137.415
Com informações do Conjur