O cancelamento automático do precatório ou da requisição de pequeno valor (RPV) enquanto esteve em vigor a Lei 13.463/2017 só é válido se caracterizada a inércia do credor em proceder ao levantamento do depósito no prazo até então estabelecido.
A conclusão é da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que fixou tese sob o rito dos recursos repetitivos sobre o tema. O enunciado é de observância obrigatória por juízes e tribunais das instâncias ordinárias.
Precatórios são pedidos de pagamento de valores devidos pela Fazenda pública em face de uma decisão judicial definitiva. RPVs são similares, mas com valores menores e rito de cobrança abreviado e simplificado.
A Lei 13.463/2017 permitiu o cancelamento dos precatórios e RPVs que não tivessem sido levantados pelos credores no prazo de dois anos. Ela vigeu de julho de 2017 até julho de 2022, quando o Supremo Tribunal Federal a declarou inconstitucional ao julgar a ADI 5.755.
O STF ainda modulou os efeitos da decisão: decidiu que ela só vale para evitar cancelamentos a partir de 6 de julho de 2022, data da publicação da ata de julgamento.
Com isso, milhares de cancelamentos foram preservados. Coube ao STJ definir o que fazer com eles.
Primeiro, a 1ª Seção entendeu que as partes poderiam pedir a expedição de novos precatórios ou RPVs. Mas que essa possibilidade se sujeita à prescrição no prazo de cinco anos, a qual passa a ser contada a partir da data de notificação do credor.
Agora, a corte foi chamada a avaliar a legalidade do procedimento adotado para o cancelamento. A votação foi unânime, conforme o voto do ministro Paulo Sérgio Domingues, relator do repetitivo.
O procedimento fixado pela Lei 13.463/2017 para o cancelamento dos precatórios e RPVs era automático. Os valores ficavam em conta reservada em instituições financeiras depositórias. Mês a mês, elas varriam essas contas para ver qual delas aguardavam levantamento há mais de dois anos.
Identificadas essas contas, a instituição financeira realizava automaticamente o cancelamento, devolvendo o valor para a Conta Única do Tesouro Nacional. A ocorrência era informada ao presidente do respectivo tribunal que emitiu o precatório e havia a intimação do credor.
Relator, o ministro Paulo Sérgio Domingues apontou que o cancelamento indiscriminado e acrítico de precatórios ou RPVs apenas em razão do tempo de dois anos decorrido é medida absolutamente desproporcional.
Isso porque abriu-se a possibilidade de cancelar precatórios e RPVs mesmo em casos em que não houve inércia do credor.
Seria o caso, por exemplo, de existência de ordem judicial impeditiva do pagamento ou eventual demora na realização de atos processuais imputável somente ao serviço judiciário.
O relator levantou a posição jurisprudencial segundo a qual o titular de uma pretensão só deve ser penalizado com a sua perda se e quando caracterizada a sua inércia no exercício daquela.
“Não se deve permitir o cancelamento automático do precatório ou do RPV em prejuízo do credor do ente federal senão quando caracterizada no processo respectivo a inércia do titular do crédito, vedando-se o cancelamento automático”, afirmou.
Restrição
Segundo o advogado especialista em precatórios e sócio do Badaró Almeida & Advogados Associados, Gilberto Badaró, a decisão apenas restringe a interpretação da modulação feita pelo STF na ADI 5.755.
“Nos casos em que o não levantamento se deu por outros motivos, a exemplo de recursos pendentes que suspenderam o pagamento, o cancelamento de precatórios foi considerado ilegal”, explica.
Com informações Conjur