Servidor contratado com desvirtuamento da singularidade temporária faz jus ao FGTS

Servidor contratado com desvirtuamento da singularidade temporária faz jus ao FGTS

O Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), em decisão relatada pelo Desembargador Domingos Jorge Chalub Pereira, julgou improcedente o recurso de apelação cível interposto contra sentença que determinou o pagamento de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) a um servidor público temporário contratado de forma irregular, isso porque o contrato temporário é excepcional, e deve atender às singularidades da lei específica. 

O acórdão reafirma o entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da nulidade dos contratos temporários desvirtuados por sucessivas prorrogações, sem observância aos requisitos do art. 37, IX, da Constituição Federal.

Contexto do Recurso
O recurso da municipalidade foi impetrado contra sentença proferida pelo juízo de primeira instância em ação ordinária movida por servidor público contratado sob regime temporário, cuja relação contratual, reiteradamente prorrogada, resultou na declaração de nulidade do contrato pelo magistrado de piso. A nulidade da avença teve como consequência a condenação do ente público, o Município de Atalaia do Norte, ao pagamento de FGTS relativo ao período trabalhado.

Argumentos da Apelante
Em sede recursal, a Prefeitura de Atalaia do Norte sustentou que o servidor foi contratado mediante processo seletivo, com respaldo na legislação vigente, não havendo que se falar em nulidade contratual. Ademais, argumentou que o regime temporário atendia aos ditames do interesse público e que a contratação seguiu os parâmetros da Lei nº 8.745/1993. Por fim, pugnou pela reforma da sentença para afastar a condenação ao pagamento de FGTS.

Fundamentação do Acórdão
Ao analisar o recurso, o Desembargador Domingos Chalub, relator do acórdão, rejeitou os argumentos da apelante, destacando que, embora a contratação temporária esteja prevista no art. 37, IX, da Constituição Federal, há exigências claras quanto ao caráter excepcional e temporário das funções exercidas. A perpetuação do contrato por meio de sucessivas prorrogações configura desvirtuamento da natureza temporária do vínculo, ferindo os princípios constitucionais que regem a administração pública.

Chalub sublinhou que, em casos de contratação temporária irregular, deve-se aplicar o entendimento firmado pelo STF nos Recursos Extraordinários nº 596.478/RR e 765.320/MG, com repercussão geral reconhecida, que asseguram ao servidor contratado sob regime temporário, cujos contratos são declarados nulos, o direito à percepção de FGTS. A interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal fundamenta-se no § 2º do art. 37 da CF/88, que estabelece a nulidade de contratações sem prévio concurso público, ressalvados os direitos ao salário e às parcelas trabalhistas.

Aplicação do Precedente do STF
A decisão enfatizou que a nulidade do contrato de trabalho temporário, desvirtuado pela prorrogação sucessiva, não exime o ente público de realizar os depósitos de FGTS na conta vinculada do trabalhador, conforme o art. 19-A da Lei nº 8.036/1990. Esse dispositivo é aplicado nos casos em que o contrato, apesar de nulo, tenha sido mantido com direito ao salário, nos moldes da orientação jurisprudencial consolidada.

O relator ressaltou que o contrato temporário, cuja natureza exige prazos definidos e necessidade temporária de interesse público excepcional, quando prorrogado indefinidamente, perde essa característica essencial e transforma-se em uma burla à regra constitucional do concurso público. Assim, restou incontroversa a nulidade da contratação, e a consequência lógica é a aplicação do direito ao FGTS, nos termos da jurisprudência consolidada.

Dispositivo
Diante dessas considerações, o Desembargador Domingos Chalub concluiu pela manutenção integral da sentença de primeiro grau, negando provimento ao recurso da Prefeitura de Atalaia do Norte. A municipalidade foi condenada ao pagamento das verbas relativas ao FGTS, conforme estipulado na decisão recorrida, com base na Lei nº 8.036/90 e na orientação firmada pelo STF.

A decisão reitera a observância estrita aos princípios constitucionais que regulam a contratação temporária, destacando a vedação de prorrogações sucessivas que desvirtuem a natureza precária do vínculo administrativo, e reforça o direito ao FGTS como medida reparatória nos casos de nulidade contratual. 

Processo n. 0600345-04.2023.8.04.2400 
Classe/Assunto: Apelação Cível / Defeito, nulidade ou anulação
Relator(a): Domingos Jorge Chalub Pereira
Comarca: Atalaia do Norte
Órgão julgador: Terceira Câmara Cível
Data do julgamento: 20/09/2024
Data de publicação: 20/09/2024

 

Leia mais

Aneel vai ao TRF1 e pede suspensão de ordem que a obriga a transferir controle da Amazonas Energia

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) protocolou recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) solicitando a suspensão da decisão proferida pela...

TJAM afasta multa por embargos de declaração que haviam sido considerados protelatórios em 1.º grau

A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas julgou recurso interposto por empresa contra sentença de vara da área cível e lhe...

Mais Lidas

Justiça do Amazonas garante o direito de mulher permanecer com o nome de casada após divórcio

O desembargador Flávio Humberto Pascarelli, da 3ª Câmara Cível...

Bemol é condenada por venda de mercadoria com vícios ocultos em Manaus

O Juiz George Hamilton Lins Barroso, da 22ª Vara...

Destaques

Últimas

Servidores grevistas do INSS não podem ter contra si registros de faltas injustificadas

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gurgel de Faria concedeu liminar para proibir o lançamento de "faltas...

STF prorroga prazo para governo federal indicar autores de emendas de comissão

O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, prorrogou por 15 dias o prazo para a Advocacia-Geral da União...

Primeiro dia de audiência pública sobre IA na Justiça aborda controle e capacitação

Especialistas de várias localidades do Brasil apresentaram, na tarde desta quarta-feira (25/9), sugestões e preocupações para o uso da...

Eleições municipais não terão voto em trânsito

Os eleitores que não estiverem em suas cidades no primeiro e segundo turnos das eleições de outubro não poderão...