O Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), com voto do Desembargador Yedo Simões de Oliveira, negou provimento ao recurso de um locatário que, diante da negativa de renovação do contrato de locação comercial, invocou a aplicação dos institutos da supressio e da surrectio. A decisão foi proferida no âmbito de uma apelação cível interposta contra sentença que reconheceu irregularidades no cumprimento das obrigações contratuais pelo locatário, em prejuízo ao locador.
O caso envolveu a inadimplência do locatário, que não quitou aluguéis e tributos, como o IPTU, e descumpriu outras obrigações previstas no contrato. Diante disso, a primeira instância julgou procedente ação de despejo promovida pelo locador. O locatário, inconformado, recorreu ao TJAM argumentando que o comportamento anterior do locador — que não teria exigido, de forma estrita e imediata, o cumprimento dessas obrigações — justificaria a aplicação da supressio. Por outro lado, requereu a invocação da surrectio, alegando que a falta de exigência consistente por parte do locador teria gerado a expectativa de renovação automática do contrato.
Fundamentos da decisão
Ao analisar a matéria, o Desembargador relator destacou que a aplicação dos institutos da supressio e da surrectio requer condições específicas não verificadas no caso. Segundo o relator, a supressio pressupõe a existência de um comportamento prolongado da parte que, ao abdicar do exercício de um direito por tempo significativo, teria criado uma situação de desequilíbrio contratual. Já a surrectio exige que a inércia de uma das partes dê origem a novos direitos em favor da outra parte.
“Na hipótese dos autos, resta configurado que o apelante descumpriu reiteradamente suas obrigações, tais como o pagamento de aluguéis e tributos, o que evidencia a quebra do pacto locatício. Não é possível reconhecer o desequilíbrio contratual em favor daquele que age em desconformidade com o ajuste estabelecido”, afirmou o magistrado.
A decisão também ressaltou que a liberdade do locador em decidir pela não renovação do contrato está amparada pela legislação, não cabendo a criação de expectativas alheias às estipulações pactuadas.
Os institutos em questão
Supressio e surrectio são institutos vinculados ao princípio da boa-fé objetiva no direito contratual. A supressio refere-se à perda de um direito pela sua não utilização durante um período significativo, enquanto a surrectio implica o surgimento de um direito ou expectativa por parte de um contratante em virtude do comportamento reiterado do outro. Ambas as situações devem estar fundamentadas em um comportamento prolongado e consistente que implique desequilíbrio entre os contratantes.
No caso analisado, o TJAM concluiu que o inadimplemento contratual por parte do locatário, além de afastar qualquer justificativa para a aplicação dos institutos, fundamentava a decisão de não renovação e despejo.
Caráter pedagógico da decisão
A decisão proferida pela Câmara Cível do TJAM reforça a importância do cumprimento das obrigações contratuais e da observação aos requisitos necessários para a invocação de institutos como supressio e surrectio. O resultado demonstra que o princípio da boa-fé, apesar de essencial, não pode ser utilizado para beneficiar parte que age em desconformidade com o contrato.
Processo n. 0778186-73.2021.8.04.0001
Classe/Assunto: Apelação Cível / Locação / Permissão / Concessão / Autorização / Cessão de Uso
Relator(a): Yedo Simões de Oliveira
Comarca: Manaus
Órgão julgador: Segunda Câmara C