Ainda que o consumidor tenha a seu favor o benefício de que seja verdade o que afirma em juízo, o fornecedor pode trabalhar para desconstruí-la. No caso em que a presunção de serem verdadeiros os fatos narrados pelo consumidor/autor do pedido tenda a ser derrubada pelo fornecedor, com trâmite da causa nos Juizados Especiais, e a demonstração das falhas dos serviços do fornecedor dependa de prova pericial, a solução é o autor levar o pedido ao juízo comum.
Como definido pela Juíza Lídia de Abreu Carvalho Frota, da Terceira Turma Recursal do Amazonas, “a complexidade da causa que afasta a competência do Juizado Especial não diz respeito à matéria em si, mas, sim, à prova necessária à instrução e julgamento do feito”, ou seja, o uso da prova pericial.
A responsabilidade do fornecedor pode ser afastada quando seja possível que demonstre que a culpa pelo dano causado possa ser atribuída a terceira pessoa. Essa hipótese pode afastar a competência dos juizados especiais cíveis para apreciar e julgar o pedido de reparação, ainda que o pedido esteja dentro do valor reservado para as causas que, de início, apontem menor complexidade.
Na ação, o autor ajuizou em desfavor da Hyundai Motor Brasil um pedido de reparação por danos materiais e morais sofridos pelos defeitos do automóvel HB20, apesar de todas as revisões realizadas na concessionária. Um pouco depois dessa revisão, o automóvel parou de funcionar. Com o retorno do autor à empresa lhe foi informado que o problema era a bomba da gasolina. Atribuiu-se como causa do estrago da bomba o combustível usado pelo motorista no carro, firmando-se que era de má procedência.
Por não ter a loja arcado com as despesas dos defeitos expostos, o autor tomou a iniciativa de realizar os reparos, com gasto de dinheiro e a perda de tempo. Com a ação proposta cobrou os danos materiais e morais sofridos. A empresa insistiu na causa de defeito, reafirmando que não era de sua responsabilidade. A Juíza entendeu que o fato dependeria de prova especializada, pois somente uma pericia poderia esclarecer porque a bomba de combustível parou de injetar. Para não prejudicar o contraditório e a ampla defesa, afastou a competência do Juizado Cível. O autor recorreu.
Ao apreciar o recurso, a Relatora observou que a empresa, na contestação, juntou laudo unilateral realizado na bomba do combustível, onde aferiu a influência de agentes externos, pela má procedência do combustível. Mas, a questão exigiria prova, por perícia específica, o que, deveras, afasta a competência do Juizado Especial Cível para processar e julgar demandas cuja natureza ofendam o rito simples de procedimentos dos Juizados Especiais.
Recurso Inominado Cível nº 0434518-57.2023.8.04.0001
Leia a ementa:
EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR.AÇÃO POR REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS EXTINTA SEM APRECIAÇÃO DO MÉRITO. MAGISTRADO DE PISO ENTENDEU PELA NECESSIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA. LAUDO DA CONCESSIONÁRIA ATESTA USO DE COMBUSTÍVEL DE BAIXA QUALIDADE. PEÇA DANIFICADA NÃO COBERTA PELA GARANTIA. RECURSO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS