Pela prática de tráfico de drogas Júnior Ferreira da Silva sofreu duas condenações penais por uma única conduta criminosa, cometida na mesma data, porém com acusação e condenação que caiu sobre si por mais de uma vez. Em recurso movido pela Defensoria Pública do Amazonas se pediu que fosse declarado a dupla incidência de punição. Como consequência, sobreveio acórdão relatado por Jorge Manoel Lopes Lins que, nos fundamentos de voto condutor, constatou a existência de condenação definitiva, com trânsito em julgado de decisão colegiada datada de 2017, o qual tramitou na Primeira Câmara Criminal, sobre os mesmos fatos debatidos no acórdão embargado e sobre o mesmo acusado, detectando que idêntico fato criminoso havia gerado a distribuição de dois processos distintos em face de uma única pessoa. Foi declarada a nulidade, de ofício, da segunda condenação.
A Defensoria Pública indicou ao Tribunal de Justiça por meio de embargos de declaração a nulidade de acórdão advindo de julgamento de recurso de apelação nos autos nº 000000613.2013.8.04.6000, na razão de que havia o trânsito em julgado de outro processo, com mesma numeração, guiado pelos mesmos fatos, o qual tramitou na Primeira Câmara Criminal.
O órgão defensor, ao fundamentar suas razões recursais, levou ao Tribunal a circunstância de que o acusado não poderia ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos, indicando a existência de bis in idem, pedindo a extinção do processo anterior, pois uma pessoa não pode ser acusada, processada e julgado duas vezes por um único fato criminoso.
Dada vista ao Ministério Público, na qualidade de fiscal da lei e órgão de sua execução, o parquet se manifestou pela ida aos autos de documento oficial certificativo dos fatos, sobrevindo certidão que atestou a existência de processo com as mesmas partes e a mesma causa de pedir o qual tramitou na Primeira Câmara Criminal do Amazonas.
Em voto condutor, o Relator Jorge Manoel Lopes Lins deliberou que, como se cuidava de coisa julgada seria vedado a reapreciação de matéria já decidida, com o objetivo de modificar o conteúdo da decisão. Se trouxe aos autos o ensinamento de Renato Brasileiro que colaciona o entendimento, assim reproduzido:
“A partir do momento em que uma decisão judicial é proferida, temos que, em determinando momento, tornar-se-á imutável, dentro do processo em que foi proferida, seja porque não houve a interposição de recursos contra tal decisão, seja porque todos os recursos cabíveis foram interpostos e decididos. A partir do momento em que não for mais cabível qualquer recurso ou tendo ocorrido o exaurimento das vias recursais, a decisão transita em julgado.(…)
Se o acusado foi condenado pela prática de determinado fato delituoso, transitando em julgado a sentença condenatória, não se pode admitir ulterior instauração de novo processo em relação aos mesmos fatos, sob pena de violação ao princípio do ne bis in idem e à coisa julgada do primeiro processo. Daí poque deve ser reconhecida a nulidade absoluta do segundo processo, ainda que tal nulidade não tenha sido arguida pelo acusado no curso deste feito ( Manual de Processo Penal, 3ª Ed., Jus Podium, 2015, p.1106).
Derradeiramente, o Tribunal do Amazonas, por sua Segunda Câmara Criminal, em unanimidade com o voto do Relator, reconheceu a violação da coisa julgada, firmando, de ofício, a declaração de nulidade do acórdão da segunda condenação, mantida a primeira condenação imposta ao acusado, em homenagem à coisa julgada que teve o efeito, reconhecido, de impedir nova condenação sobre fato já decidido anteriormente.
Leia o acórdão:
SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CRIMINAL Nº 0005719-43.2021.8.04.0000. EMBARGANTE: JÚNIOR FERREIRA DA SILVA. EMBARGADO (A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO AMAZONAS. RELATOR: DESEMBARGADOR JORGE MANOEL LOPES LINS. PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EXISTÊNCIADE COISA JULGADA. ACÓRDÃO ANTERIOR TRANSITADO EM JULGADOCOM IDENTIDADE DE PARTES, CAUSA DE PEDIR E PEDIDO. VIOLAÇÃODA COISA JULGADA. BIS IN IDEM CONFIGURADO. NULIDADE DADECISÃO QUE TRANSITOU POR ÚLTIMO EM JULGADO. DECLARAÇÃO DE NULIDADE “EX OFÍCIO”. 1. O cabimento do presente recurso prescinde da existência de omissão, contradição, obscuridade, ambiguidade ou erro material na decisão impugnada, sendo vedada a reapreciação de matéria já decidida, com objetivo de modificar o conteúdo decisório de um pronunciamento judicial, porquanto destina-se apenas a esclarecer, complementar e aperfeiçoar alguns aspectos das decisões
judiciais. 2. Não obstante os embargos declaratórios não se prestem ao questionamento,
imperioso consignar que o reconhecimento da coisa julgada consiste em matéria de ordem pública, razão pela qual se impõe o conhecimento quanto a este ponto ex ofício. 3. Na hipótese dos autos, constata-se a existência de condenação definitiva, com trânsito em julgado de decisão colegiada datada de 2017, o qual tramitou na Primeira Câmara Criminal, sobre os mesmos fatos debatidos no Acórdão de fls. 292/316, consoante atesta a certidão de fl. 13, ensejando, por sua vez, a ocorrência do indesejável bis in idem, violando a coisa julgada, ocasião em que deve ser anulada, de modo a prevalecer a primeira proferida, ante o critério da precedência. 4. Embargos acolhidos, em parte, para declarar, ex ofício, a nulidade do Acórdão de fls. 292-316, para reconhecimento da coisa julgada e consequente
extinção do processo ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores que compõem a Segunda Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, por unanimidade de votos, em conhecer e acolher, em parte, os presentes Embargos de Declaração para declarar, ex ofício, a nulidade do Acórdão de fls.
292-316, nos termos do voto que acompanha a presente decisão. Sala de sessões do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, em Manaus. PRESIDENTE RELATOR
PROCURADOR DE JUSTIÇA