A ministra Laurita Vaz – primeira mulher a presidir o Superior Tribunal de Justiça (STJ) – completa 21 anos de atuação na corte. Natural de Goiás, ela trilhou longa carreira no Ministério Público antes de ser nomeada para o Tribunal da Cidadania, em junho de 2001.
A ministra iniciou a carreira como promotora de justiça em Goiás, em 1978. Depois, foi procuradora da República, de 1984 a 1989, oficiando perante o Supremo Tribunal Federal. Na década de 1990, atuou, já como como subprocuradora-geral da República, perante o Superior Tribunal de Justiça, até ser nomeada ministra. Somados os períodos como representante do Ministério Público Federal perante o STJ e como ministra, já são três décadas de atividades no STJ.
Laurita Vaz presidiu o tribunal e o Conselho da Justiça Federal (CJF) no biênio 2016-2018. Atualmente, integra a Corte Especial, a Terceira Seção e a Sexta Turma, da qual é presidente. A ministra também exerceu outras funções no CJF e no Tribunal Superior Eleitoral.
Para o atual presidente do STJ, ministro Humberto Martins – que foi vice na gestão de Laurita Vaz –, a ministra se destaca pela disposição para o diálogo, pela sensibilidade e pela dedicação profissional.
“Em sua trajetória como julgadora e também como primeira mulher a presidir a corte, a ministra Laurita Vaz sempre foi um exemplo de magistrada ética, altiva, de notável saber jurídico e imbuída de um espírito público inquebrantável”, afirmou.
Durante a sua gestão, a ministra conseguiu atingir o objetivo principal de reduzir o acervo processual do STJ. Ao longo dos dois anos, o estoque de processos diminuiu em 25%, feito inédito. Isso foi possível graças ao investimento em gestão de precedentes, à criação de uma força-tarefa para auxiliar os gabinetes, à ampliação e reestruturação do Núcleo de Admissibilidade e Recursos Repetitivos (Narer) e ao uso da inteligência artificial para mapear e classificar processos.
No último ano, Laurita Vaz foi relatora de importantes casos que ajudaram a construir a jurisprudência do STJ em matéria penal. Confira, na sequência, alguns destaques dos julgamentos ocorridos entre 2021 e 2022.
Em abril deste ano, ao julgar um caso em segredo de justiça, a Sexta Turma reafirmou que o sentido da expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica”, trazida no artigo 241-E do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), não se restringe às imagens de genitália desnuda ou de relações sexuais.
Segundo o colegiado, com base no princípio da proteção integral da criança e do adolescente, o alcance da expressão deve ser definido a partir da análise do contexto da conduta investigada, e é imprescindível verificar se há evidência de finalidade sexual – o que pode ocorrer sem a exposição dos genitais do menor.
A ministra Laurita Vaz, relatora, apontou que a interpretação do ECA, como previsto em seu artigo 6º, deve sempre levar em consideração os fins sociais a que a lei se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
Por isso, de acordo com a magistrada, “ao amparo desse firme alicerce exegético”, é forçoso concluir que o artigo 241-E do estatuto, “ao explicitar o sentido da expressão ‘cena de sexo explícito ou pornográfica’, não o faz de forma integral e, por conseguinte, não restringe tal conceito apenas àquelas imagens em que a genitália de crianças e adolescentes esteja desnuda”.
Em junho do ano passado, no julgamento do Tema 1.077 dos recursos repetitivos, a Terceira Seção estabeleceu a tese de que as condenações criminais transitadas em julgado, não consideradas para caracterizar a reincidência, só podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria da pena, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização para desabonar a personalidade ou a conduta social do agente.
A ministra Laurita Vaz explicou que o artigo 59 do Código Penal elenca oito circunstâncias judiciais para a individualização da pena na primeira fase da dosimetria: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime, além do comportamento da vítima.
Segundo a magistrada, a conduta social diz respeito à valoração do comportamento do réu no convívio social, na família e no trabalho, enquanto a avaliação da personalidade deve considerar, com base em elementos do processo, fatores como a insensibilidade ou a desonestidade do agente.
Para a relatora, “o vetor dos antecedentes é o que se refere única e exclusivamente ao histórico criminal do agente” (REsp 1.794.854).
Em agosto, ao julgar o HC 525.799, a Sexta Turma entendeu que a colaboração premiada prestada pelo chamado informante confidencial pode ser equiparada à notícia-crime anônima, tendo em vista que ambas se prestam exclusivamente a noticiar suposta existência de crime e provocar a polícia a realizar as diligências preliminares para averiguar a veracidade das informações.
No caso analisado, Laurita Vaz destacou que o suposto ex-integrante da organização criminosa, ao dar informações à autoridade policial, evidentemente, o fez sob a condição de não ter sua identidade revelada, “uma vez que todos nós sabemos como são tratados aqueles que se voltam contra o crime organizado”.
Ela considerou que a colaboração prestada por informante confidencial pode ser “perfeitamente equiparada” à notícia-crime anônima, tendo em vista os seus objetivos de trazer à tona a existência de crime e dar início às diligências policiais preliminares.
Fonte: STJ