O Tribunal de Justiça do Amazonas decidiu que não configura ilícito causador de danos à direitos de personalidade a publicação pela imprensa de notícia que relate uma prisão em flagrante pela prática de crime, mesmo que depois o suspeito venha a ser inocentado pela justiça, isto porque a responsabilidade dos órgãos de imprensa não é objetiva. Não há nessa prática, quando adstrita à narração dos fatos e ao dever de informação, nenhum elemento jurídico que possa aferir a causação de prejuízos de natureza moral. Não se deve exigir dos veículos de informação uma linguagem jurídica. Foi Relator o Desembargador Flávio Humberto Pascarelli Lopes. Nos autos, a empresa Gate Mídia Ltda – Portal do Holanda, foi representada pela Advogada Bianca Farias de Paulla.
Por meio do Acórdão, a Corte de Justiça corrigiu uma sentença de primeiro grau que concluíra que teria ocorrido prática abusiva da liberdade de informação jornalística, firmando pela incidência de veiculação caluniosa e difamatória ante a atribuição da prática de um crime, e que, neste contexto, teria ocorrido o extravasamento do direito constitucional da informação. A sentença retificada concluiu que a notícia foi veiculada com linguagem pejorativa, do tipo ‘esquema criminoso’, ‘comparsas’, etc.
Com o recurso das empresas de comunicação, o Jornal A Crítica e Gate Mídia Ltda- Portal do Holanda, a Corte de Justiça reformou a sentença, e fundamentou que os veículos de comunicação não incidiram na prática abusiva editada na sentença, não ocorrendo os danos à direitos de personalidade, como erroneamente firmados.
O acórdão ponderou que ‘não se pode exigir da imprensa a utilização de toda a tecnicidade dos procedimentos judiciais, mas sim, a utilização de expressões de forma simples, clara e direta, para os seus leitores’, e assim não se identificou menoscabo, difamação ou injúria ao autor, como se reconheceu, indevidamente, na sentença de primeiro grau. Mas, como firmou o acórdão, a linguagem jornalística é uma linguagem simples, sem apego a formalismos jurídicos.
Ademais, as matérias haviam sido amparadas em informações policiais, editadas com amparo em cotejo a um auto de prisão em flagrante delito, não se detectando nenhum sensacionalismo, apenas o relato dos fatos, e na escrita que é peculiar a esses meios de comunicação. Tendo sido os fatos narrados de forma objetiva e por terem ficado adstritos aos limites do interesse público na informação e no exercício da função social de informar, reformou-se a sentença condenatória de primeiro grau.
Os fatos narrados na ação se referiram a um possível furto de mercadorias ocorrido nas dependências dos Supermercados DB, em Manaus, por funcionários que findaram sendo inocentados na ação penal que lhes foi movida.
Processo nº 0630219-68.2014.8.04.0001
Leia o acórdão:
Apelação Cível / Direitos da Personalidade. Relator(a): Flávio Humberto Pascarelli Lopes. Comarca: Manaus. Órgão julgador: Terceira Câmara Cível. Data do julgamento: 19/04/2023. Data de publicação: 19/04/2023. APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. IMPRENSA. MATÉRIA JORNALÍSTICA NOTICIA A PRISÃO EM FLAGRANTE DA AUTORA EM RAZÃO DE SUPOSTO COMETIMENTO FURTO. POSTERIOR ABSOLVIÇÃO DEMANDANTE. A RESPONSABILIDADE DOS ÓRGÃOS DE IMPRENSA NÃO É OBJETIVA. REPORTAGEM CIRCUNSCRITA AO ANIMUS NARRANDI, A PARTIR DA DESCRIÇÃO DOS FATOS EM BOLETIM INFORMATIVO DA POLÍCIA MILITAR. AUSÊNCIA DE INJÚRIA, DIFAMAÇÃO, CALÚNIA, OFENSA, ABUSO DE LINGUAGEM, CRÍTICA OU QUALQUER OUTRA CIRCUNSTÂNCIA QUE DESBORDE O INTERESSE PÚBLICO NA INFORMAÇÃO, OS LIMITES DA LIBERDADE DE IMPRENSA E A FUNÇÃO SOCIAL DO JORNALISMO. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DE INFORMAR (ART. 5º, INCS. IV E IX, DA CF E ART. 188, INC. I, DO CC). SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDOS. 1.Não configura ato ilícito a publicação, por periódico, de evento relativo à prisão da demandante por suspeita de autoria de crime – mesmo que, posteriormente, haja absolvição, desde que a matéria se atenha aos limites narrativos do acontecido, respeite o imperativo constitucional de presunção de inocência e não desborde do interesse público na informação, porque tal hipótese restringe-se à função social do livre dever de informar (art. 5º, inc. IV e IX, da CF) e do exercício regular de direito (art. 188, inc. I, do CC). 2.Recursos conhecidos e providos.