Os quase 21 milhões de negros e negras formam a fatia da população brasileira que mais sofre com o racismo, ataques pessoais, injúrias e mortes violentas no País. Esse grupo étnico também é o mais afetado pelas desigualdades sociais, discriminação nos ambientes de trabalho e salários reduzidos, se comparado com as pessoas consideras brancas. De acordo com o estudo ‘Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil’, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o rendimento médio real habitual do trabalho principal de pessoas brancas, na Paraíba, era cerca de 88,3% superior ao das pretas e 55,9% maior que o das pardas, em 2021.
O levantamento apresenta informações sobre mercado de trabalho e distribuição de renda, condições de moradia, patrimônio, educação, violência e participação na gestão. Enquanto as pessoas declaradas brancas tinham um rendimento médio de R$2.284, acima da média do estado (R$1.706), para as negras esse valor era de R$1.213 e para as pardas de R$1.465. Os indicadores se referem à parcela da população de 14 anos ou mais de idade, que estava ocupada formal ou informalmente na semana de referência.
Para o gestor do Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial, no âmbito do Tribunal de Justiça da Paraíba, juiz Jailson Shizue Suassuna, o TJPB tem enfrentado essas desigualdades, através do Comitê Permanente pela Promoção da Equidade Racial, do qual faz parte e que é presidido pela vice-presidente do Tribunal, desembargadora Maria das Graças Morais Guedes. “O Poder Judiciário estadual tem tomado medidas efetivas no combate ao racismo contra negros e negras. Temos um compromisso de promover uma reparação histórica em relação a essas pessoas, que possa minorar as desigualdades, sobretudo, na esfera do Judiciário”, comentou o magistrado, titular da Vara Única da Comarca de Bananeiras.
Conforme a analista judiciária e coordenadora pedagógica da ESMA, do TJPB, Daiane Lins da Silva Firino, o debate da temática da equidade racial é de suma importância no cotidiano da sociedade e, consequentemente, no Judiciário paraibano. “A discussão reforça o compromisso do Tribunal com a luta por um Judiciário mais eficiente e igualitário. A luta é legitima, pois existem muitas barreiras que excluem e marginalizam os negros e negras. Ainda hoje, de forma clara, as desigualdades se perpetuam, sendo dessa forma, relevante e atual das discussões, lutas e ações que busquem sensibilizar e promover equidade de oportunidades, tratamento justo e reconhecimento social e institucional para tais grupos”, comentou.
O integrante da Marcha da Negritude Unificada da Paraíba (MNUPB), Leonardo Ferreira da Silva, mais conhecido como ‘Léo Negro’, concorda com a pesquisa do IBGE e disse que a precarização do trabalho atinge muito mais pessoas negras que pessoas não negras. “Antes a justificativa era a baixa qualificação que alcançava muito mais a população preta e parda. Agora é, simplesmente, a forma que o mercado tem de nos excluir dos processos seletivos, para criar um exército de mão de obra barata e baixar a remuneração de quem está contratado”, pontuou.
“Atualmente, temos mais acesso à educação formal, e, muitas vezes, somos até mais qualificados, mas em momentos de crise econômica os primeiros a serem demitidos são os trabalhadores e trabalhadoras negras”, destacou.
Léo Negro trabalha com pesquisa social no Observatório Paraibano Antirracismo, onde concentra esforços em traçar estratégias e planos para lidar com os casos de racismo que surgem na Paraíba. “Desde 2019, foco no enfrentamento ao racismo estrutural, além de articular outros movimentos e organizações sociais”, informou.
Segundo ele, existem algumas políticas públicas implementadas na Paraíba para combater o racismo. No âmbito estadual, Léo destacou o Plano de Promoção da Igualdade Racial da Paraíba (Planepir), que tem um conjunto de ações para promoção da igualdade racial e combate ao racismo. Já âmbito nos municípios, ele afirmou que é preciso conversar com cada gestor público e questionar o que falta para que sejam colocadas em prática ações afirmativas na reparação da condição de subalternidade em que se encontra a maior parte dos moradores das periferias das grandes cidades, que coincide com a maioria das pessoas pretas e pardas.
“No Estado também existem organizações ou movimentos sociais que trabalham especificamente para combater o racismo. Esses grupos de cultura e de afirmação da identidade negra, que compõe o ‘Movimento Negro na Paraíba’. Ainda existem o Movimento de Ação Negra (Movane), grupos de Capoeira e HipHop, os grupos culturais e de teatro negro e o Fórum de Artistas Pretos e Pretas da Paraíba”, pontuou Léo Negro.
Números – O chefe da Seção de Disseminação de Informação do IBGE da Paraíba, Jorge Souza Alves, no cenário geral do estado da Paraíba, segundo o IBGE, o rendimento médio mensal real domiciliar per capita, em 2021, era de R$872. O recorte por cor ou raça verificou que, entre brancos, seu valor (R$1.163) era superior à média, enquanto entre pretos (R$621) e pardos (R$745) era menor. O levantamento indica ainda que, em relação à mesma cor ou raça, havia diferenças nos valores recebidos por homens e mulheres.
“No país, em relação à taxa de desocupação, a pesquisa aponta que o percentual era bem maior entre aqueles que se declararam pretos (18,9%) e pardos (17,7%), do que entre os brancos (12,2%). O indicador é calculado pela proporção de pessoas que estavam sem trabalhar, mas procuraram uma oportunidade”, informou Jorge Souza Alves.
Mortes violentas – Historicamente, o assassinato de homens e mulheres negras lidera os rankings de homicídios no Brasil. A violência cotidiana que atinge a todos os brasileiros explica apenas uma parte da situação, enquanto o racismo, como elemento estruturante e presente em todos os aspectos da sociedade brasileira, agravando no aumento da miséria e do desemprego, impactam o cenário de mortes dessa população.
Dados do Atlas da Violência 2023, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), revelam que só em 2021, a população negra respondeu por 79% das mortes violentas no País. Isso representa uma taxa de 31 homicídios para cada 100 mil habitantes desse grupo populacional, contra uma taxa de 10,8 para pessoas não negras, a soma de amarelos, brancos e indígenas. O Atlas ainda mostra que de 2011 e 2021, foram assassinadas 445.527 pessoas negras
Tipos de Racismo – Especialistas e estudiosos da sobre a matéria definem sete tipos de racismo que são praticados diariamente no Brasil e no mundo. São eles:
Racismo individual – Refere-se às atitudes, crenças e comportamentos preconceituosos de indivíduos. Pode ser expresso através de insultos, agressões físicas, discriminação no local de trabalho ou em interações cotidianas.
Racismo institucional – Está incorporada nas instituições sociais, como o sistema educacional, o mercado de trabalho e no setor de habitação. É fácil perceber o racismo institucional na desigualdade no financiamento de escolas em bairros predominantemente negros.
Racismo estrutural – É caracterizado como uma forma mais ampla e sistêmica de racismo institucional, na qual a sociedade, como um todo, se organiza para perpetuar a desigualdade racial. É um padrão histórico e cultural que vai além das ações ou intenções individuais.
Racismo cultural – Envolve a desvalorização ou a tentativa de apagar a cultura, história e tradições de um grupo racial. Ele pode se manifestar através da imposição de uma cultura dominante sobre outras.
Racismo interpessoal – Ocorre nas interações entre indivíduos e pode incluir comportamentos explícitos e agressivos, como insultos raciais, ou formas mais sutis, como microagressões; o racismo internalizado, quando indivíduos das raças marginalizadas aceitam, consciente ou inconscientemente, atitudes racistas em relação ao próprio grupo racial.
Com informações TJPB