A teoria do desvio produtivo do consumidor é aplicável a eventual episódio em que uma empresa deixe de resolver um problema de cobrança indevida com boleto falso mesmo diante de reclamações do cliente. A tese prevê que o tempo perdido pelo consumidor para resolver problemas causados por maus fornecedores gera dano indenizável.
Com base nisso, a 26ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) condenou uma concessionária de energia elétrica a indenizar em R$ 5 mil um consumidor prejudicado por pagar boletos falsos.
O autor da ação relatou que, embora tivesse quitado um boleto da concessionária vencido em 13 de junho de 2023, no valor de R$ 75,93, duas cobranças seguintes trouxeram avisos de débitos pendentes.
O cliente chegou a ir duas vezes a uma filial da concessionária e enviou comprovantes de quitação por e-mail, até receber, contudo, uma ameaça de corte da energia.
Dada a inércia da empresa, ele ainda quitou duas vezes uma fatura de agosto. Nesse período, o consumidor se viu então envolvido em uma dinâmica de fraude, em que pagou boletos falsos.
Em primeiro grau, a Justiça acatou apenas a inexigibilidade dos R$ 75,93 referentes a junho de 2023. Foi negado, contudo, a restituição simples ou em dobro desse valor ao consumidor e o pagamento de indenização por danos morais pela concessionária. Ainda foi imposto ao autor o pagamento de 29/30 das custas e honorários advocatícios.
Já a 26ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP apontou, ao dar provimento parcial a um recurso do consumidor, a responsabilidade da concessionária de energia para que a fraude fosse consumada, uma vez que o boleto falso trazia dados pessoais e do histórico de consumo do cliente, o que deveria estar sob os cuidados da empresa.
O acórdão do tribunal também destacou que o documento apresentava um nome empresarial parecido ao da empresa, não sendo exigível da vítima que desconfiasse da fraude, e que o cliente buscou a resolução.
“Não há como ignorar o descaso da ré com as reclamações que lhe foram apresentadas pelo consumidor, ao deixar de resolver o problema da cobrança indevida decorrente do boleto falso”, escreveu o relator, o desembargador Carlos Dias Motta.
Além da inexigibilidade do débito de junho de 2023, foi determinada a restituição simples de R$ 75,93 ao consumidor, e não em dobro, dada a ausência de má-fé da concessionária. Também foi determinada a indenização de R$ 5 mil para compensar os contratempos do cliente, e não de R$ 30 mil, o que ele pedia inicialmente e foi compreendido como excessivo, tendo em vista os princípios de razoabilidade e da proporcionalidade.
O acórdão também estabeleceu que a empresa vai arcar “com os encargos da sucumbência e com os honorários advocatícios fixados em 20% do valor da condenação, não sendo o caso de arbitramento por equidade”.
Processo 1006073-46.2023.8.26.0266
Com informações Conjur