Perda de direitos políticos por condenação não impede posse em cargo público

Perda de direitos políticos por condenação não impede posse em cargo público

A suspensão dos direitos políticos decorrente de condenação criminal transitada em julgado não impede a nomeação e a posse de candidato aprovado em concurso público. Esse entendimento, firmado em repercussão geral, é do Plenário do Supremo Tribunal Federal.

A corte julgou nesta quarta-feira (4/10) o caso de um homem aprovado em concurso para o cargo de auxiliar de indigenismo na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Condenado a uma pena privativa de liberdade por tráfico de drogas, ele teve os direitos políticos suspensos e foi impedido de tomar posse, ainda que em liberdade condicional.

A maioria do colegiado seguiu o voto do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso. Para ele, em respeito ao princípio da dignidade humana, o Estado deve fornecer as condições necessárias para a integração social do condenado.

Segundo o relator, a Constituição estabelece a possibilidade de suspensão dos direitos políticos, mas não do direito de trabalhar, ainda que em cargo público.

Alexandre foi seguido pelos ministros André Mendonça, Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso, presidente da corte. O ministro Dias Toffoli acompanhou o relator quanto à tese, mas divergiu sobre sua aplicação ao caso concreto. O ministro Kassio Nunes Marques se declarou impedido, já que a corte analisa recurso contra decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que ele integrava antes de ir ao Supremo, e o ministro Gilmar Mendes não votou.

“A Constituição estabelece como um dos princípios fundamentais da República o valor social do trabalho. O principal objetivo da execução penal é proporcionar as condições necessárias para a harmônica integração social do condenado”, afirmou Alexandre.

Ainda segundo o ministro, o trabalho tem função importante na ressocialização. “Em nenhum momento a Constituição impede que o condenado possa prestar concurso e que, passando, possa ser nomeado e empossado.”

Para o ministro Luís Roberto Barroso, ainda que a Lei 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos, considere o gozo dos direitos políticos como requisito básico para a investidura em cargo público, uma série de leis incentiva o trabalho e a ressocialização.

“O Direito exige uma interpretação sistemática. Penso que a incidência dessa norma na situação específica frustraria os valores constitucionais da dignidade e do direito ao trabalho”, afirmou o presidente do STF.

Com a decisão, foi fixada a seguinte tese:

A suspensão dos direitos políticos prevista no artigo 15 inciso 3º da Constituição não impede a nomeação e posse de candidato aprovado em concurso público, desde que não incompatível com a infração penal praticada, em respeito ao princípio da dignidade humana e do valor social do trabalho, e ao dever do Estado em proporcionar as condições necessárias para a harmônica integração social do condenado, objetivo principal da execução penal. O início do efetivo exercício do cargo ficará condicionado ao regime da pena ou à decisão judicial do juízo de execuções, que analisará a compatibilidade de horários”.

Divergência
O ministro Cristiano Zanin abriu divergência, mas só foi acompanhado no caso concreto por Dias Toffoli, que entendeu pela impossibilidade da posse. Na tese, no entanto, Toffoli seguiu Alexandre.

Segundo Zanin, o artigo 15, inciso 3, da Constituição Federal é claro ao determinar a suspensão dos direitos políticos em caso de condenação transitada em julgado enquanto durarem seus efeitos.

“Em que pese o louvável esforço do recorrido, que mesmo em situação prisional e em livramento condicional buscou uma nova vida através do estudo, logrando a aprovação em concursos públicos, devem ser observadas as regras dos certames, bem como as condições imposta pela lei para a investidura de cargo público.”

O ministro também afirmou que leis podem criar requisitos para a nomeação e posse em concursos, e que um entendimento contrário só poderia ser adotado se o Supremo declarasse a inconstitucionalidade de trecho da Lei 8.112/1990.

“Abrir uma exceção nesse caso concreto acarretaria, na minha compreensão, em invasão do Judiciário na seara legislativa. Tal medida só seria possível diante da declaração da inconstitucionalidade do inciso 2 do artigo 5 da Lei 8.112/1990.”

Zanin propôs a seguinte tese: “A condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos, suspende o gozo de direitos políticos, impedindo a investidura em cargo público”.

Caso concreto
No caso julgado, o TRF-1 deu provimento ao pedido do autor para que ele pudesse tomar posse no cargo para o qual foi aprovado.

Segundo o tribunal, não é razoável impedir o acesso a cargo público. A decisão de segunda instância afirma que a ressocialização de presos também se estende à administração pública.

A Funai, então, foi ao STF afirmando que as regras do concurso público existem para todos e não podem ser afastadas, sob pena de violação dos princípios constitucionais da isonomia e da legalidade.

O órgão argumentou que o texto constitucional é claro ao determinar a suspensão dos direitos políticos enquanto durarem os efeitos da condenação, que são mantidos ainda que o apenado esteja em liberdade condicional.

RE 1.282.553

Com informações do STF

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