Penduricalhos do Judiciário: a antítese do modelo único de subsídios

Penduricalhos do Judiciário: a antítese do modelo único de subsídios

A Constituição Federal de 1988, no art. 39, §4º, estabeleceu que a remuneração dos agentes públicos, incluindo magistrados, seria feita exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedados adicionais, gratificações e outras formas de acréscimo salarial. Essa medida visava simplificar a remuneração e, ao mesmo tempo, combater práticas que resultavam em descontrole orçamentário e desigualdades dentro do serviço público.

O subsídio único tinha o objetivo de garantir:

Transparência – Todos os valores recebidos seriam fixos e de conhecimento público.
Previsibilidade – O subsídio seria calculado sem variações ou adendos, facilitando o planejamento orçamentário.
Isonomia – Magistrados em situações equivalentes deveriam receber valores idênticos, sem distorções provocadas por adicionais.
No entanto, a aplicação prática dessa política revelou uma realidade distinta, na qual surgiram os chamados “penduricalhos”, que contrariam os princípios fundadores do modelo de subsídio.

A antítese: penduricalhos e fragmentação remuneratória

Apesar da vedação explícita, diversos tribunais passaram a incorporar auxílios, gratificações e indenizações aos contracheques dos magistrados, justificando-os como verbas de caráter indenizatório, que não estariam sujeitas ao teto constitucional. Exemplos incluem:

Auxílio-moradia: Concedido mesmo a magistrados que possuem residência própria na comarca.
Auxílio-alimentação: Incluído como verba indenizatória em alguns estados.
Gratificações acumuladas: Como como compensação em dinheiro por dias de folga a cada três dias de trabalho ou atuação em plantões. No Estado do Amazonas, o denominado acervo processual, à titulo de indenização, rende um extra de R$ 10.400 a Juízes, modelo que foi seguido pelo Ministério Púbico do Amazonas. 

Esses adicionais transformaram o subsídio, de uma parcela única, em uma remuneração composta por valores que não são padronizados e frequentemente superam o teto constitucional. Essa prática gerou uma série de problemas:

Desigualdade – Juízes recebem remunerações bastante díspares, devido à disparidade de “penduricalhos”. A prática desfavorece os aposentados, há anos sem reajustes, embora tenham direito à paridade e isonomia. 
Falta de transparência – Muitos desses adicionais são pouco divulgados ou apresentados de forma fragmentada nos portais de transparência.
Impacto orçamentário – A fragmentação dificulta o controle financeiro e aumenta a imprevisibilidade no planejamento fiscal.
Combate aos penduricalhos: necessidade de coerência institucional

Essa prática, em nada republicana, exige:

Regulamentação clara e uniforme – Estabelecer diretrizes nacionais para a concessão de benefícios, limitando distorções regionais.
Transparência absoluta – Tornar público, de forma clara, o detalhamento da remuneração de magistrados.
Fortalecimento do teto constitucional – Reforçar a aplicação do limite remuneratório, inclusive para verbas indenizatórias e zelar pelos direitos de aposentados que cada vez mais se distanciam desses benefícios e estão com suas rendas fragilizadas. 
 
A existência de penduricalhos na remuneração dos magistrados reflete uma antítese ao ideal do subsídio único, desafiando os princípios de transparência, previsibilidade e isonomia. O tema exige enfrentamento contínuo, com reformas estruturais e controle rigoroso. Para preservar a legitimidade do Judiciário e a confiança da sociedade, é imperativo que a remuneração dos magistrados seja condizente com os princípios constitucionais, sem brechas que permitam distorções ou privilégios indevidos.

Leia mais

Advogado condenado por morte de motorista não obtém no STJ pedido de colocação em cela especial

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Herman Benjamin, negou pedido de habeas corpus apresentado por um advogado condenado a 20 anos...

STF mantém condenação contra empresa de energia no Amazonas por apagão

O Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou o pedido da VP Flexgen Ltda para suspender os efeitos de uma decisão da...

Mais Lidas

Justiça do Amazonas garante o direito de mulher permanecer com o nome de casada após divórcio

O desembargador Flávio Humberto Pascarelli, da 3ª Câmara Cível...

Bemol é condenada por venda de mercadoria com vícios ocultos em Manaus

O Juiz George Hamilton Lins Barroso, da 22ª Vara...

Destaques

Últimas

Distrito Federal é condenado a indenizar usuária por acidente em academia pública

Usuária de academia popular, instalada pelo Governo do Distrito Federal, obteve na Justiça o reconhecimento de seu direito a...

Lula deseja êxito a Trump e pede avanço em parcerias

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva emitiu nota oficial para cumprimentar o presidente dos Estados Unidos, que tomou...

Advogado é intimado por juiz a representar a si próprio e sua mãe em processo trabalhista

O juiz Josué Cecato, da Vara do Trabalho de Cruzeiro (SP), decidiu intimar um advogado habilitado em um processo...

TRF1: Paralisia causada por vacina gera indenização e pensão vitalícia

A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por unanimidade, deu parcial provimento à apelação contra...