A.F. da S. foi acusado pelo Ministério Público pela prática do crime de estupro há 18 anos atrás, com vítima menor de 14 anos de idade. Na época, vigia o tipo penal descrito no artigo 213 do CP, que definia estupro e atentando violento ao pudor em único tipo penal. Considerado crime hediondo pela lei 8.072/90, não admitindo liberdade provisória, a pena era cumprida em regime integralmente fechado, com sanção especialmente agravada pelo fato da menoridade da vítima. A 1ª. Vara Especializada em Crimes Contra a Dignidade Sexual de Crianças e Adolescentes veio a conhecer e julgar a matéria quando estava em vigor a lei 12.015/2009, que introduziu no Código Penal, o artigo 217.A, criando o tipo do estupro de vulnerável, com pena máxima privativa de liberdade em 15 anos de reclusão. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos era a nova tipologia penal a partir de 2009. Como o fato foi praticado antes da vigência da nova lei, esta retroagiu para beneficiar o apelante, em decisão confirmada pelo Tribunal de Justiça do Amazonas. A decisão consta nos autos do processo 0550181-45.2009. Foi relatora a Desembargadora Vânia Maria Marques Marinho.
Para a relatora, os crimes de natureza sexual são praticados às ocultas, motivo pelo qual não se apresentam testemunhas diretas ou visuais do delito, destacando-se a palavra da ofendida pelo crime como prova de valor irrefutável. O acusado pediu a absolvição, mas fora impossível o TJAM atender o pleito, pois a ofendida, apesar de não se recordar de pequenos detalhes, fora firme e decisiva para reconhecer a autoria do delito em persecução penal.
“O fato de a vítima não lembrar de pequenas detalhes do crime é perfeitamente compreensível, mais ainda quando a narrativa que interessa à tipificação da conduta e à comprovação da autoria não padece de qualquer contradição”, emitiu a relatora em voto decisivo que integrou o julgado.
“Após a Lei 12.015/2009, os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, quando praticados contra vítima menor de quatorze anos, passaram a ser descritos no art. 217-A do Código Penal. Essa modificação afastou a aplicação da causa de aumento de pena prevista no artigo 9º da Lei dos Crimes Hediondos, que seria aplicável no caso uma vez que o crime foi praticado mediante emprego de violência real. Contudo, apesar de a Lei nº 12.015/2009 ter determinado o recrudescimento da pena, deve ela retroagir por ser mais benéfica ao Réu, tratando-se de verdadeira ‘novatio legis in mellius’, uma vez que também determinou a revogação da causa de aumento prevista no artigo 9º da Lei nº 8.072/90”.
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