Diferente do Inquérito, onde a autoridade policial inicia a investigação de um crime do zero após notícia da prática do crime, a ação penal lançada pelo Promotor de Justiça se espera a prova da existência do crime e fundada suspeita da autoria. Sem esses requisitos mínimos a ação penal poderá ser trancada por meio de habeas corpus. Outras hipóteses admitem o writ, à exemplo de processos criminais em curso com punibilidade extinta; atipicidade da conduta ou até a inépcia da peça acusatória. Se tranca ação penal, também, se restar clara causa de exclusão de ilicitude ou de culpabilidade.
No caso examinado pelo Desembargador José Hamilton Saraiva dos Santos, do TJAM, o HC narrou que a autoridade policial sequer indiciou o Paciente- acusado na ação penal-, por entender que não havia indícios de sua participação nos delitos de roubo a um posto de gasolina.
Os fatos revolvem a um assalto em um posto de gasolina, em setembro de 2022, em que os meliantes renderam o frentista e tiveram acesso ao posto, subtraindo aproximadamente R$ 200 mil. Os assaltantes teriam sido resgatados por outro veículo e o dinheiro teria sido levado a uma agência de viagens, onde fora dividido, com a ciência do paciente, que teria dado local seguro para essa atividade.
Ainda que não tenha ocorrido o indiciamento pela autoridade policial há se relembrar que esse ato é uma das etapas do inquérito policial e que o Ministério Público poderá, inclusive dispensar o inquérito, oferecendo a denúncia se de outras provas dispor. No caso examinado se observou que a ação penal foi instaurada não somente com base no inquérito mencionado, pois o Promotor de Justiça havia instaurado um procedimento extrajudicial com o qual fez maiores coletas de informações que o subsidiaram.
Mesmo sem o indiciamento do Delegado de Polícia, que no inquérito afastou a possibilidade de que o paciente tivesse prévia ciência do assalto cujo rendimento foi dividido em sua agência, é sustentável a denúncia pelo Ministério Público, titular da ação penal, com fulcro em outros elementos de prova. No caso se narrou na peça acusatória que tenha o suspeito agido em coautoria, com atuação independente, mas com unidade de desígnios com os demais atores da prática criminosa no assalto ao posto de combustível. Nestas circunstâncias, a Primeira Câmara Criminal, adotando as razões jurídicas do Relator, negou o pedido de trancamento da ação penal que se encontra em curso.
Processo nº 4008129-35.2023.8.04.0000
Leia o acórdão:
Classe/Assunto: Habeas Corpus Criminal / Roubo Majorado Relator(a): José Hamilton Saraiva dos Santos Comarca: Manaus Órgão julgador: Primeira Câmara Criminal Data do julgamento: 01/09/2023Data de publicação: 01/09/2023
Ementa: CONSTITUCIONAL, PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO E COMUNICAÇÃO FALSA DE CRIME. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE PROVAS DA MATERIALIDADE E DE INDÍCIOS DE AUTORIA. NÃO OCORRÊNCIA. ELEMENTOS FÁTICO-PROBATÓRIOS SUFICIENTES. PRESENÇA DE JUSTA CAUSA. EXORDIAL QUE SE AMOLDA PERFEITAMENTE AO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONHECIDA E DENEGADA. 1. Com efeito, o trancamento de Ação Penal pela via estreita do Habeas Corpus é medida de exceção, cabível apenas quando verificada a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade, a manifesta inépcia da exordial acusatória ou a patente ausência de provas da materialidade ou de indícios de autoria, configurada de plano por meio de prova pré-constituída, tendo em vista que o exame aprofundado de provas é inadmissível no espectro processual do writ, cujo manejo pressupõe ilegalidade ou abuso de poder flagrante. Precedentes. 2. No caso sub examine, o Impetrante pugna pelo trancamento da Ação Penal que tramita em desfavor da Paciente, tendo em vista a ausência de prova da materialidade e de indícios de autoria das condutas imputadas a ela. Todavia, infere-se que a Denúncia está embasada em provas documentais contidas na Ação Penal originária e nas declarações extrajudiciais colhidas, havendo, ao menos em juízo perfunctório, indícios suficientes de autoria e materialidade, suficientes para dar início à persecução penal, além de permitir à Ré o pleno exercício do seu direito de defesa, nos termos do art. 41 do Código de Processo Penal, de sorte que o trancamento prematuro da Ação Penal seria o mesmo que cercear a pretensão acusatória do Estado. 3. Nesse ensejo, não há fundamento para o acolhimento da tese defensiva atinente à ausência de prova da materialidade e de indícios de autoria. Ora, as condutas, em tese, praticadas aperfeiçoaram-se por meio de coautoria quando os Réus, em conjunto ou separadamente, mas em unidade de desígnios, subtraíram grande quantidade de dinheiro em espécie de um posto de gasolina, comunicaram falsamente um crime para tentar acobertar o delito que praticaram e dirigiram-se até o local de propriedade da Acusada para separar o dinheiro com a sua ciência. 4. Mercê dessas considerações, inexiste justificativa para se trancar a Ação Penal originária, tendo em vista que, para viabilizar a concessão da ordem de trancamento da ação penal, deve haver prova inequívoca e pré-constituída da atipicidade das condutas ou, ainda, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade dos delitos, o que não ocorreu no vertente episódio. Precedentes. 5. Ordem de Habeas Corpus CONHECIDA E DENEGADA