O Desembargador João Mauro Bessa, do Tribunal de Justiça, fixou que a regra que exige a perícia para a comprovação do crime de incêndio deve ser relativizada, embora seja crime que deixe vestígios. A inviabilidade na elaboração desse laudo permite que o crime seja demonstrado por outras provas, especialmente quando haja uma justificativa que permita a exceção à regra, podendo a prova pericial ser substituída pelo depoimento de testemunhas que atestem a existência do fato criminoso, e confirmado por outros meios de prova, como a ocorrência policial, relatório de regulação de sinistros, e outros meios. O acusado A.A. G, havia também requerido a desclassificação para incêndio culposo, ao argumento de que estava dentro da casa, mas a tese também foi rejeitada no julgamento da apelação.
O fato se deu no âmbito da violência doméstica, e ocorreu em março de 2020, sobrevindo a condenação em primeira instância. Ameaçando a companheira, o agressor tocou fogo na casa gritando: “eu quero falar contigo filha da puta, se tu fosse homem te chamava pra porrada, tudo que ou vou fazer é por tua culpa”, e ateou fogo na casa. Condenado, pediu a reforma da sentença, negada em segunda instância.
“A materialidade do crime de incêndio, cuja prática deixa vestígios, deve ser comprovada por meio de exame de corpo de delito. Todavia, segundo jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal, tal comando pode ser mitigado quando houver justificada inviabilidade da elaboração do exame de corpo de delito e o crime puder ser demonstrado através de outros elementos de prova”, firmou o acórdão.
No apelo, o interessado ainda pediu que se reconhecesse o fato de que teria agido em razão de consumo de bebida alcoólica, porém, como examinado, o reconhecimento da excludente de culpabilidade em razão de consumo de álcool pressupõe que os efeitos decorrentes da embriaguez tenham sido provenientes de caso fortuito ou força maior ou de anomalia psíquica, o que não se verificou na hipótese dos autos.
Processo nº 0000012-77.2020.8.04.7001
Leia o acórdão:
Relator: João Mauro Bessa. Revisor: Carla Maria Santos dos Reis. APELAÇÃO CRIMINAL – CRIMES DE INCÊNDIO MAJORADO E AMEAÇA – CONCURSO MATERIAL – VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS CONFIGURADAS – ESPECIAL RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA – AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DE DELITO POR PRECARIEDADE DO APARATO TÉCNICO DA POLÍCIA DA COMARCA – CRIME DEMONSTRADO
ATRAVÉS DE OUTROS ELEMENTOS DE PROVA – DOLO DO AGENTE CONFIGURADO – CONSUMO VOLUNTÁRIO DE BEBIDA ALCOÓLICA – POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE – AUSÊNCIA DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR – NÃO EXCLUÍDA A IMPUTABILIDADE PENAL – DOSIMETRIA – COMPENSAÇÃO DE AGRAVANTE E ATENUANTE – RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO.