Um erro repetido por três vezes pelo Ministério Público Federal impediu o Superior Tribunal de Justiça de julgar um recurso contra o trancamento da ação penal que tem como alvo o procurador da República Ângelo Goulart Villela, acusado de vazar informações da investigação batizada de operação “greenfield”.
Segundo o MPF, em 2017, o procurador, que atuava na operação, revelou informações sobre investigações envolvendo o grupo empresarial J&F. Ele é acusado de corrupção passiva, violação de sigilo funcional, obstrução de investigação criminal e lavagem de dinheiro.
Em fevereiro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, afastou Villela de suas funções. E em junho, a Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 1ª Região trancou a ação penal contra o procurador.
Ao interpor o recurso, o Ministério Público Federal sustentou que o não-recebimento da denúncia violou o artigo 41 do Código Penal, que trata da pena privativa de liberdade do condenado que tem reconhecida a existência de doença mental.
O correto seria apontar o artigo 41 do Código de Processo Penal, que prevê o rito para o oferecimento da denúncia: deve ter a exposição do fato criminoso, com todas suas circunstâncias, a qualificação do acusado, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
Para o MPF, a ação contra o procurador da República preencheu plenamente todos os requisitos. O problema foi confundir o CP com o CPP, fato que levou à inadmissão do recurso e o não conhecimento dos sucessivos agravos.
A falha levou à inadmissão do recurso especial no TRF-1. O MPF agravou sem corrigir o erro, o que fez a presidência do STJ negar provimento. E interpôs agravo regimental à 6ª Turma, que também negou provimento, em julgamento na terça-feira (4/10).
Erro repetido
Primeiro, a presidência do TRF-1 apontou que a causa não tem qualquer relação com o artigo 41 do CP. Portanto, inadmitiu o recurso especial, considerando que a petição do MPF “não permitiu que se formasse adequada compreensão da controvérsia”.
Aplicou-se por analogia a Súmula 284 do STF, segundo a qual “é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.
Ao agravar a decisão, bastaria ao MPF afastar a aplicação do enunciado e esclarecer o erro material. Em vez disso, o órgão suscitou a aplicação do artigo 41 do CPP para afastar a Súmula 7, que impede o STJ de reanalisar fatos e provas.
O recurso não apenas ignorou o fundamento usado pela presidência do TRF-1, como repetiu o erro material de citar o artigo 41 do CP. Com base em regras do Regimento Interno, a presidência do STJ não conheceu do agravo interno.
A decisão citou que “em atenção ao princípio da dialeticidade recursal, a impugnação deve ser realizada de forma efetiva, concreta e pormenorizada, não sendo suficientes alegações genéricas ou relativas ao mérito da controvérsia, sob pena de incidência, por analogia, da Súmula 182 do STJ”.
No agravo regimental, o MPF alegou que “ainda que em alguns momentos no recurso especial tenha sido feita referência, por erro material, ao artigo 41 do Código Penal, resta evidente que a matéria de recebimento da denúncia está contida no artigo 41 do Código de Processo Penal, consoante se evidenciados embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal e do próprio recurso especial“.
Esse caminho todo foi o que levou o ministro Rogerio Schietti, relator do recurso, a negar provimento ao agravo regimental do MPF. A votação na 6ª Turma foi unânime. Só participaram do julgamento os ministros Antonio Saldanha Palheiro e Sebastião Reis Júnior.
“Por isso, a Presidência desta Corte Superior não teve alternativa a não ser reconhecer o óbvio, que o MPF ignorou, no agravo em recurso especial, o fundamento baseado na Súmula 284 do STF usado pela Corte a quo para inadmitir o recurso especial“, concluiu o relator.
Fonte: Conjur