MPF pede à Justiça Federal que cancele projeto de créditos de carbono do Governo do Amazonas

MPF pede à Justiça Federal que cancele projeto de créditos de carbono do Governo do Amazonas

Fernando Merloto Soave e Igor Jordão Alves, Procuradores da República no Amazonas, ajuizaram ação civil pública contra o Governo do Estado do Amazonas para que a Justiça Federal suspenda todos os atos administrativos em andamento pela SEMA/AM sobre o projeto carbono, e, por consequência, das empresas indevidamente selecionadas, segundo o MPF, uma vez que são tendentes a implementar projeto de crédito de carbono / REDD+ em Unidades de Conservação do Estado, em descompasso com regras e experiências concretas que depõem contra a iniciativa. 

A ação pede a notificação da Funai, para se manifestar como deseja compor a lide, uma vez que o projeto ofenda a direito de consulta livre, prévia, informada e de boa-fé de que são titulares os povos indígenas, cujos direitos são tutelados pela Funai. 

Entenda a medida do MPF:

De acordo com o MPF, o projeto REDD tem o pretexto de evitar o desmatamento, com a  proteção de florestas e redução de emissões de CO₂. Porém, para tanto, primeiro se define  uma “linha de base”, que estima o desmatamento esperado sem o projeto, com base no histórico de áreas similares. Depois, projeta-se quanto desmatamento será evitado ao longo de 20, 30 ou 50 anos com a implementação do projeto. Isso é imaginário, diz o órgão. 

A diferença entre o desmatamento esperado e o evitado gera créditos de carbono, que podem ser vendidos. Mas a previsão impõe o uso de um cálculo impossível de fazer porque depende de muitos fatores que ninguém saberá com precisão como irão se comportar nos próximos 30 a 50 anos. É algo feito por hipótese, sem bases sólidas. 

Os créditos de carbono permitem que empresas poluidoras compensem suas emissões comprando créditos gerados por projetos de proteção de florestas, como o REDD. Com isso, elas podem dizer que são “sustentáveis” sem mudar nada no jeito que poluem.

O problema é que, ao invés de reduzir a poluição, muitas empresas, no sistema projetado, poderão comprar créditos de carbono e continuar com as mesmas práticas devastadoras. Isso pode criar a falsa ideia de que estão ajudando o meio ambiente, sem de fato estimular mudanças reais em suas ações ou na sociedade.

Daí se gera um círculo vicioso, em que empresas que certificam estes créditos, e mesmo as auditorias que acompanham a certificação, na verdade, não estão apenas “certificando”, e sim gerando, criando os créditos de carbono.

É como se eles fossem “casas da moeda” que emitissem notas de dinheiro a partir dos estudos, comparações e levantamentos de “desmatamento evitado”, mas ao invés de dinheiro, estão criando “créditos de carbono”, que depois viram dinheiro. Quanto mais “desmatamento evitado” certificado, mais créditos de carbono, mais dinheiro entrando, mais poluição sendo permitida e “compensada” em toda a terra.

Com estes e outros fundamentos, o Ministério Público Federal no Amazonas promoveu ação civil pública contra o Governo do Estado e a Funai.  Os procuradores pedem à Justiça que determine, cautelarmente, a suspensão do projeto de crédito de carbono que foi alçado pelo governo local, através da Sema, à categoria de agente de Redução das Emissões de carbono por Desmatamento e Degradação Florestal, com reflexos diretos sobre unidades de conservação estaduais onde vivem e habitam tradicionalmente povos indígenas e tradicionais, aí se inserido ribeirinhos, extrativistas, que vivem nessas áreas há séculos. 

O propósito da medida, de acordo com o MPF, é o de amplos debates públicos sobre o tema, e que se cancele, ao final do processo, com a sentença de mérito, os editais e atos da SEMA/AM, para permitir que os povos indígenas e tradicionais tenham liberdade de escolher e definir os projetos para seus territórios, conforme direitos garantidos por lei, em especial   a previsão da Convenção 169/OIT. 

O MPF noticia que recebeu documentação oriunda da Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas, a Apiam, onde a comunidade indígena informa que não foram submetidos a qualquer consulta, não conhecem e sequer sabem como funciona o crédito carbono e REDD+, até porque a Secretaria do Meio Ambiente do Estado não ouviu as comunidades.  

Os procuradores também informam que a Sema já escolheu e já permitiu até mesmo a entrada de empresas nas comunidades sem nem dialogar e pedir permissão aos reais  donos da terra, os ribeirinhos e extrativistas, com flagrante violação a direitos indígenas. 

Afora essa questão, os Procuradores explicam que o mecanismo de Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD) foi lançado como a principal política e ferramenta internacional para combater o desmatamento, durante uma das conferências anuais internacionais dos governos sobre clima, em histórico de 17 anos de experiências concretas.

Essas experiências dão conta de que o REDD, que tem como principal promessa reduzir de forma eficiente e rápida as emissões sobre a atmosfera como resultado do desmatamento, possui muitos problemas, sendo que o desmatamento e a devastação florestal aumentam de forma crescente, e que as promessas de mudanças climáticas por meio dessa política sequer avançou, apontando apenas aumento de lucros para poucos beneficiados. 

Os Procuradores pedem à Justiça que, na hipótese de atendimento da medida cautelar, com a suspensão do Projeto, seja aplicada multa diária ao Governo do Estado, na hipótese de que a medida possa vir a ser descumprida. No mérito, pede a confirmação da medida cautelar e a imposição de danos morais coletivos avaliados em R$ 5 milhões, a serem convertidos em prol das comunidades indígenas. 

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