A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que uma ação relativa a motoristas de caminhão que transportam cana-de-açúcar com cargas superiores ao máximo permitido pela lei de trânsito é de competência da Justiça do Trabalho, que deve examinar e julgar o caso. O colegiado concluiu que a questão envolve o meio ambiente de trabalho dos motoristas, com descumprimento de normas relativas à saúde e segurança do trabalhador.
O Ministério Público, por meio da Procuradoria do Trabalho no Município de Araçatuba (SP), ajuizou a ação civil pública em 2015 para impedir que os motoristas das empresas paulistas Pioneiros Bioenergia S.A. e Usina Santa Adélia S.A. trafeguem com caminhões em vias públicas com carga que exceda o limite de tolerância previsto no Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/1997).
Em alguns casos, segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), motoristas transportam carga mais de 86% acima da tonelagem máxima permitida. O excesso de peso acarreta risco maior de acidentes por diversas causas, entre elas limitação da mobilidade do veículo, despencamento da cana-de-açúcar, tombamento do veículo e desgastes acentuados nos freios e pneus impostos pelo sobrepeso, informou o MPT.
No exame do caso, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região entendeu que o tema não era da competência da Justiça do Trabalho, pois o conflito giraria em torno do cumprimento de normas de trânsito e nenhuma matéria trabalhista ou relacionada a trabalhadores teria sido apresentada.
Além disso, registrou que a petição inicial buscaria o nexo entre o trabalho e o descumprimento da legislação de trânsito “por mera presunção acerca da possibilidade de agravamento das condições laborais”, porque acidentes de trânsito no transporte de carga seriam muito comuns e haveria posicionamento da Justiça do Trabalho de que a atividade é de risco.
Para o relator do recurso de revista, ministro Cláudio Brandão, o desatendimento das normas que regulam o limite de cargas embora representem, de início, violação das regras do Código de Trânsito Brasileiro, com risco a uma infinidade de indivíduos, representa também, “de modo direto, risco mais acentuado de acidentes para aquele que se encontra na direção”. Segundo ele, a matéria em discussão é, sim, da competência da Justiça do Trabalho, por envolver questão referente ao meio ambiente de trabalho dos motoristas.
O ministro ressaltou que “pensar que o tema só interessa ao Poder Público para fins de aplicação de sanções de trânsito é negar que, para o motorista, o meio ambiente do trabalho resulta das circunstâncias em torno das quais o seu trabalho é realizado”. Isso incluiria as condições de manutenção do veículo, limites à jornada de trabalho, concessão de intervalos, proibição de utilização de substâncias psicoativas, entre outras circunstâncias, “todas elas componentes da higiene, saúde e segurança do trabalho”, frisou.
Ele apresentou informações de empresas e portais relacionados ao tema, apontando como o excesso de carga dos caminhões aumenta as chances de acidentes, inclusive fatais. Uma das empresas, especializada em softwares para gestão de transporte rodoviário, indicou que, conforme o Atlas da Acidentalidade no Transporte Brasileiro, “cerca de 43% dos acidentes que ocorreram nas principais estradas do Brasil envolvendo caminhões tiveram como principal causa o excesso de peso transportado por eles”. Esse atlas, informou o relator, foi desenvolvido pelo Programa Volvo de Segurança no Trânsito (PVST), em parceria com a Polícia Rodoviária Federal, para mostrar a situação da acidentalidade nas rodovias federais.
A regra limitadora do peso máximo a ser transportado no caminhão, conforme Brandão, embora esteja inserida no Código de Trânsito, “possui interseção com as normas ambientais trabalhistas e integra o sistema de proteção da segurança do trabalho e de preservação à saúde do trabalhador”. Por isso, se o acidente viesse a ocorrer, “nenhuma dúvida subsistiria quanto à competência desta Justiça para analisar ações nas quais o empregado buscasse o ressarcimento dos danos eventualmente causados, fossem eles patrimoniais, extrapatrimoniais, estéticos ou mesmo existenciais”, completou.
Portanto, segundo ele, não seria razoável que a mesma competência assegurada para o julgamento dos pedidos que envolvem as consequências do acidente seja afastada no caso de ação “em que se pretende assegurar medidas para evitar que o acidente venha a ocorrer”. No entender de Cláudio Brandão, a apreciação e o julgamento de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público, com pedidos relativos à adequação do meio ambiente de trabalho, para determinação de cumprimento de obrigações relativas à saúde, à segurança e à proteção dos trabalhadores, inserem-se no âmbito da competência material da Justiça do Trabalho.
O colegiado acompanhou o voto do relator e acolheu o recurso do Ministério Público, declarando a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a ação, determinando o retorno dos autos ao TRT da 15ª Região para que prossiga no exame da matéria.
Processo: RR-12366-36.2015.5.15.0056
Fonte: Asscom TST