O Superior Tribunal de Justiça, sob a relatoria do Ministro Ribeiro Dantas, absolveu uma ré condenada a 5 anos e 10 meses por tráfico de drogas, após reconhecer a ilegalidade de busca pessoal que resultou na apreensão de 4,56g de cocaína. A decisão anulou a condenação imposta pelo TJAM e restabeleceu a sentença absolutória.
O caso, que envolveu questões complexas acerca da legalidade de provas obtidas mediante busca pessoal sem mandado, trouxe à tona, mais uma vez, um debate sobre a necessária observância do artigo 244 do Código de Processo Penal (CPP), que exige fundada suspeita para a realização de revistas pessoais.
A ré, inicialmente absolvida pela Juíza Rosália Guimarães, teve sua condenação imposta em sede de apelação pelo TJAM, que reformou a sentença absolutória e a condenou, com base no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, às penas de 5 anos e 10 meses de reclusão, além de 583 dias-multa, a serem cumpridos em regime inicial semiaberto. O Ministério Público do Estado do Amazonas havia recorrido da absolvição, e o TJAM acolheu o recurso, revertendo a decisão de primeiro grau.
Insatisfeita, a defesa da ré, representada pelo Defensor Público Fernando Serejo Mestrinho, impetrou habeas corpus no STJ, sustentando a ilegalidade da busca pessoal que resultou na apreensão de entorpecentes. A defesa argumentou que a revista realizada pela polícia não atendia ao standard probatório exigido pelo artigo 244 do CPP, uma vez que se baseou exclusivamente na fuga da ré ao avistar a viatura policial, sem que houvesse qualquer indício concreto de crime em curso. A ausência de qualquer flagrante ou comportamento que indicasse a prática de ilícito penal foi central à argumentação defensiva, que pedia a nulidade das provas obtidas e, por consequência, a absolvição da paciente.
O Ministro Ribeiro Dantas, ao analisar o writ, destacou que, em conformidade com a jurisprudência do STJ, não cabe habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, salvo em casos de flagrante ilegalidade. Diante disso, passou a examinar as alegações defensivas à luz da possibilidade de constrangimento ilegal.
Na análise do caso, o Ministro destacou que a jurisprudência do STJ tem sido firme ao determinar que a revista pessoal sem mandado somente se justifica se houver fundada suspeita vinculada a uma circunstância concreta que indique a prática de crime. No entanto, conforme ressaltado pelo relator, não há espaço para abordagens baseadas em meras suspeitas genéricas, tampouco para práticas que possam configurar “fishing expeditions”, ou seja, investigações sem critério e exploratórias, realizadas na esperança de encontrar elementos incriminatórios.
No caso em tela, a tentativa de fuga da ré e de sua corré ao avistarem os policiais foi o fundamento utilizado para justificar a abordagem e a revista pessoal. Todavia, o Ministro Ribeiro Dantas observou que a decisão condenatória proferida pelo TJAM não indicava qualquer comportamento concreto ou circunstância que apontasse que a ré estivesse envolvida em atividade criminosa ou na posse de drogas antes da busca. Assim, o relator ponderou que, à luz da detida análise dos autos, a decisão de primeiro grau que havia absolvido a ré merecia prevalecer, tendo em vista que a busca pessoal extrapolou os limites da legalidade e não foi precedida por qualquer indício de flagrante delito.
Diante da exclusão da prova principal — a apreensão de 13 porções de cocaína (4,56g) —, que se deu em decorrência da busca pessoal ilegal, o Ministro concluiu que a condenação não poderia subsistir. Ao final, determinou a absolvição da ré com fulcro no artigo 386, inciso VI, do CPP, que prevê a absolvição quando não há prova suficiente da materialidade delitiva.
A decisão do STJ reafirma que o simples fato de um cidadão fugir ao avistar uma viatura policial, sem a presença de outros elementos que configurem fundada suspeita, não é suficiente para justificar a realização de buscas pessoais.
HABEAS CORPUS Nº 946878 – AM (2024/0354643-8)