O Superior Tribunal Militar (STM) manteve a condenação de uma mulher e do ex-companheiro dela por fraude contra o sistema de pensão do Exército Brasileiro. A mulher, 40 anos mais nova, casou-se em cartório com um ex-combatente da Força Expedicionária, na época com 89 anos, na cidade de Recife (PE).
O idoso, que era sogro da acusada, tinha Alzheimer e morreu poucos meses após o casamento. Após a morte, a mulher passou a receber a pensão por quase 10 anos, até ser denunciada por uma das netas do idoso, que alegou que a mulher havia armado o casamento para burlar o sistema de pensão e induzir o Exército Brasileiro ao erro.
De acordo com o Ministério Público Militar, ambos os réus residiam com o ex-combatente, não sendo possível determinar se o idoso tinha conhecimento do plano arquitetado por eles e concordava livremente com sua participação, ou se foi enganado e tomou parte do plano de forma inocente, devido à sua saúde debilitada.
“O fato é que, no dia 29 de setembro de 2011, o ex-combatente e a nora se casaram, embora, na verdade, jamais tivessem tido ou viriam a ter uma relação matrimonial efetiva. Ele morreu em 9 de dezembro de 2012 e, conforme planejado pelos dois denunciados, a mulher, na condição de viúva, deu entrada, em 10 de janeiro de 2013, no requerimento de habilitação à pensão.”
Até outubro de 2021, ela recebeu mais de R$ 435 mil no total, causando um prejuízo de mais de R$ 919 mil aos cofres públicos, traduzidos em valores de hoje.
Na Justiça Militar da União (JMU), o casal foi processado e julgado na Auditoria Militar de Recife, onde o juiz federal da Justiça Militar, de forma monocrática, considerou ambos culpados pelo crime de estelionato e os condenou a uma pena de três anos de prisão.
A defesa do casal, no entanto, recorreu da decisão junto ao Superior Tribunal Militar, em Brasília.
Em maio passado, durante o julgamento de apelação, o ministro Artur Vidigal de Oliveira pediu vistas para melhor analisar o processo. Nessa terça-feira (13), a Corte voltou a apreciar o caso.
No seu voto, o ministro Artur Vidigal votou pela absolvição de ambos os acusados. Para ele, houve um casamento em cartório e foi expedida uma certidão de casamento, com fé pública, a qual não poderia ser admitida como fraude.
Posição do STM
No entanto, em sentido contrário, o relator do processo, ministro Marco Antônio de Farias, discordou e afirmou que, apesar de haver uma certidão de casamento oficial, a verdade dos fatos mostrava que tudo não passou de uma grande fraude contra o sistema de pensão do Exército.
O ministro explicou que a doença de Alzheimer é a forma mais comum de demência degenerativa em idosos e se caracteriza pela evolução lenta e progressiva que resulta na destruição das funções mentais essenciais.
“O cenário leva o paciente à demência, termo usado para indicar que o indivíduo perdeu sua capacidade de raciocínio, julgamento e memória, tornando-se dependente de apoio em suas atividades diárias. A doença é fatal e, além de deteriorar a memória, compromete progressivamente as habilidades da vida diária, causando a perda da capacidade de raciocínio, julgamento e organização”, disse o relator, para comprovar que o idoso não sabia o que estava fazendo quando se casou com a nora.
“O casamento da ré com ele foi um engodo aplicado contra a Administração Militar, que permaneceu em erro diante dessa falsa percepção de realidade. O referido matrimônio, fraudulento desde a origem, provocou efeitos danosos para os cofres públicos após o óbito do ex-combatente. O prejuízo recaiu sobre os recursos destinados às pensões castrenses e no desvio das funções primordiais de militares e dos meios que foram dedicados à investigação do caso, atingindo a Ordem Administrativa das Forças Armadas”.
O ministro afirmou ainda que ficou comprovado que o casal, a nora e o filho do idoso, viviam juntos no quarto de casal, enquanto o ex-combatente permanecia em dormitório próprio.
“Os réus arquitetaram o casamento da ré com o ex-combatente com o intuito de induzir e manter a Administração Militar em erro e, assim, obter a pensão especial. O falseamento intencional da verdade, sobretudo no tocante às exigências para a percepção de pensão, com o intuito de burlar os controles oficiais e obter vantagem pecuniária indevida, configura o crime de estelionato. O delito de estelionato, perpetrado contra as instituições públicas, em suas variadas formas, afeta a Ordem Administrativa. Nessa espécie típica, é impossível dissociar, do rol das consequências, os infortúnios causados à gestão dos recursos orçamentários”.
Por maioria de votos, os ministros do STM seguiram os argumentos do relator e mantiveram a condenação de primeiro grau.
APELAÇÃO Nº 7000663-31.2023.7.00.0000
Com informações do STM