Lei que proíbe banheiros unissex em creches e escolas é inconstitucional

Lei que proíbe banheiros unissex em creches e escolas é inconstitucional

É inconstitucional a lei que cria obstáculos à manifestação plena da personalidade e do gênero, propagando discriminação e preconceitos.

Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo julgou inconstitucional uma lei de Piquete, que proibia a transformação de banheiros masculinos e femininos em banheiros de gênero (unissex) na rede pública e privada de ensino, incluindo creches, escolas e universidades.

A norma, de iniciativa parlamentar, obrigava as instituições de ensino a manter banheiros masculinos e femininos separados. A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral de Justiça com o argumento de que o texto afrontou os preceitos da dignidade humana e da liberdade de orientação sexual. Por unanimidade, a ADI foi julgada procedente.

Segundo o relator, desembargador Vico Mañas, a lei feriu o princípio do pacto federativo, pois, nos termos do artigo 22, XXIV, da Constituição, compete privativamente à União legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional. “A competência do município para legislar sobre educação é apenas suplementar à da União e dos Estados, os quais estipulam as balizas a serem seguidas dentro daquela temática”, disse.

Para o magistrado, a norma desrespeita regras constitucionais, pois limita a liberdade, desconsidera a solidariedade humana, dissemina tratamento desigual e preconceitos de sexo, “obsta o pleno desenvolvimento da pessoa, esvazia a formação e o exercício da cidadania, impõe obstáculos para o acesso e permanência na escola, restringe a liberdade de aprender e de divulgar o pensamento, infirma a garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida”.

Ao ferir tantos direitos fundamentais, prosseguiu Mañas, a lei violou os princípios da dignidade humana, da não discriminação, da igualdade e da liberdade. “Ao abraçar ideologia retrógrada sobre o que se entende por ‘gênero’, vinculada exclusivamente ao sexo biológico/anatômico, a lei espalha preconceitos e promove tratamento discriminatório como um todo, ferindo, em qualquer situação, a própria dignidade humana.”

O relator disse que o gênero está relacionado ao autoconhecimento do indivíduo, que pode concluir que não se insere exatamente nas acepções tradicionais da dualidade masculino/feminino, “ambas, aliás, construções sociais, fruto do que a sociedade entende como tal, e não resultado determinista do sexo biológico/anatômico, como parecem crer os responsáveis pela edição da lei impugnada”.

Conforme Mañas, como a lei cria obstáculos à manifestação de gênero, acaba impedindo a expressão da própria identidade da pessoa, atingindo-a em sua dignidade, privando-a de direitos da personalidade e constrangendo sua liberdade. “Dessa maneira, conduz à desigualdade, por apenas legitimar a identidade de gênero concordante com o sexo biológico, nada mais constituindo do que fonte de discriminação e preconceito. Diploma legal de tal espécie, à evidência, não pode permanecer no ordenamento jurídico”, concluiu.

Lei semelhante
Em maio, o Órgão Especial do TJ-SP também anulou, em votação unânime, uma lei semelhante de São Bernardo do Campo, que proibia a instalação de banheiros unissex ou compartilhados em estabelecimentos ou espaços públicos e privados no município.

O relator, desembargador Vianna Cotrim, disse que a lei impugnada implica restrição à liberdade de escolha de parcela da população que não se identifica exclusivamente com o gênero feminino ou com o masculino, configurando conduta discriminatória vedada pela Constituição Federal.

“Isto porque, a proibição de que estabelecimentos públicos e privados criem em seus espaços banheiros compartilháveis obriga pessoas transgêneros, queers, intersexuais, entre outros, a se enquadrarem em conceitos de masculino ou feminino com os quais não se identificam, dando azo à inegável constrangimento, malferindo, com isso, o princípio da dignidade da pessoa humana”, explicou.

Na visão de Cotrim, não se pode obrigar qualquer ser humano a se reconhecer de forma diversa daquela como ele mesmo se enxerga, sob pena de violação das garantias e liberdades constitucionais adotadas pelo Estado Democrático de Direito Brasileiro, dentre as quais a liberdade, o bem-estar, a igualdade e a dignidade.

Leia o acórdão

Processo 2210878-97.2022.8.26.0000

Com informações do Conjur

Leia mais

Juíza anula questão discursiva da PMAM e manda computar nota de candidata no Amazonas

Decisão da juíza Etelvina Lobo Braga, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Manaus, reconheceu ilegalidade na cobrança de conteúdo não previsto no edital...

Nova lei do Amazonas já produz efeitos e garante redução de jornada para servidor com dependente especial

Com base na nova redação da norma, fica assegurado a redução de três horas diárias na jornada de trabalho, sem prejuízo da remuneração, para...

Mais Lidas

Justiça do Amazonas garante o direito de mulher permanecer com o nome de casada após divórcio

O desembargador Flávio Humberto Pascarelli, da 3ª Câmara Cível...

Bemol é condenada por venda de mercadoria com vícios ocultos em Manaus

O Juiz George Hamilton Lins Barroso, da 22ª Vara...

Destaques

Últimas

Brasil decreta luto oficial de sete dias pela morte do papa Francisco

O governo brasileiro decretou luto oficial de sete dias em homenagem ao papa Francisco, falecido nesta segunda-feira (21). A...

A falácia da paridade dos aposentados: igualdade aparente, desigualdade combatida pela ANAMPA

Por João de Holanda Farias, Advogado, Egresso do Ministério Público do Amazonas Na última reunião da CONAMP, em 9 de...

Juíza anula questão discursiva da PMAM e manda computar nota de candidata no Amazonas

Decisão da juíza Etelvina Lobo Braga, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Manaus, reconheceu ilegalidade na cobrança de...

Nova lei do Amazonas já produz efeitos e garante redução de jornada para servidor com dependente especial

Com base na nova redação da norma, fica assegurado a redução de três horas diárias na jornada de trabalho,...