A vida pessoal do servidor público se insere dentro da garantia fundamental de proteção à intimidade. Não é dado à administração pública, à pretexto de que o servidor dentro de sua vida íntima tenha se conduzido com menosprezo à função pública, instaurar um PAD contra o funcionário, com motivação genérica, ainda mais quando o servidor esteja afastado de suas funções, por ser dirigente de entidade sindical de classe.
Com essa disposição, a Juíza Anagali Marcon Bertazzo, do Juizado da Fazenda Pública, declarou nulos quatro PAD’s instaurados irregularmente contra um policial civil. Se o ato administrativo, à evidência, revele que nenhum desvio funcional tenha se derivado do comportamento pessoal do servidor, o ato é ilegal e deve ser anulado. A administração nada tem a ver com o que o funcionário faz em horário diverso do período no qual presta expediente, ainda mais quando o servidor está regularmente afastado da função, editou a magistrada.
O autor, escrivão de Polícia Civil, narrou que no exercício do mandato de Presidente do SINPOL sofreu a instauração de procedimentos administrativos, acusando-os de irregulares e carregados de perseguição administrativa por ter se mantido íntegro na busca de direitos da classe. Levantou dentre os fundamentos jurídicos que entendeu viáveis para a anulação dos PAD’s que os processos administrativos na verdade apuravam fatos relacionados a sua vida privada, opondo a inexistência de vínculo funcional com a matéria objeto das investigações, até porque esteve de licença para execução de mandato classista sindical.
Ao decidir, a magistrada editou sentença julgando procedente o pedido de anulação, determinando o trancamento das investigações sob pena de multa diária e tornou definitivo, em reafirmação de suas razões jurídicas, os fundamentos descritos na tutela cautelar que em medida de urgência, anteriormente suspendeu a persecução administrativa contra o funcionário.
“Embora os procedimentos apresentem fundamentação em eventual transgressão disciplinar, é necessário observar que o fundamento aplicado para a abertura dos procedimentos dizem respeito a vida privada do autor, situação esta que expôs a sua vida privada na medida em que a imagem que foi lesada ou prejudicada foi a do próprio demandante, que teve suas atitudes devassadas e noticiadas correlacionando sua pessoa ao fato de pertencer aos quadros da instituição”
Comportamentos de índole estritamente privados não afetam o serviço público, mormente quando não se correlacionem com atos da vida funcional ou sejam vazios sobre qualquer repercussão na vida funcional ou na instituição na qual o funcionário trabalhe, fixou a sentença como razão de anular a investigação administrativa.
O Estado recorreu.
PROCESSO 0694344-98.2021.8.04.0001