Sem a promessa concreta de causar mal injusto e diante da falta de intenção inequívoca de atacar a honra alheia, os supostos crimes de ameaça e de injúria, respectivamente, carecem de comprovação, devendo prevalecer o princípio do in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu).
Com essa fundamentação, a 3ª Turma Recursal da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF) manteve a absolvição de um homem acusado de ameaçar o deputado federal Arthur Lira (PP-AL) e injuriar um atendente de telemarketing da Câmara dos Deputados.
Os supostos delitos foram cometidos em outubro de 2021, por meio de telefonema do réu ao serviço 0800 da casa legislativa. Irritado por não conseguir falar com Lira, que à época presidia a Câmara, ele xingou o atendente e disse “tem que matar todos”.
“A gravação da ligação revela um episódio de destempero e indignação, sem promessa concreta de mal injusto contra Arthur Lira, tampouco evidência suficiente de lesão à honra do atendente”, concluiu o juiz federal Francisco Alexandre Ribeiro.
Relator do recurso inominado interposto pelo Ministério Público Federal, Ribeiro ponderou que o funcionário da Câmara, “como profissional de atendimento ao público, deveria estar habituado a lidar com situações de conflito verbal”.
O julgador observou que o Direito Penal deve ser aplicado com subsidiariedade, reservando-se às condutas de maior gravidade social, “o que não se verifica na hipótese dos autos”. O seu voto para negar provimento ao recurso foi seguido pela maioria.
Elemento subjetivo
Na sentença que absolveu o réu, o juiz Ricardo Augusto Soares Leite, do Juizado Especial Criminal adjunto à 10ª Vara Federal da SJDF, vislumbrou “dúvida razoável” acerca da presença do dolo específico exigível nos crimes de injúria e ameaça.
Conforme Leite, “apesar de extrapolarem o contexto de mera crítica”, as palavras proferidas pelo réu decorreram de sua indignação e seu descontrole, sem o dolo específico de causar mal injusto e grave ao deputado ou de ofender a honra do atendente.
Ao recorrer da absolvição por insuficiência de provas, o MPF sustentou que o réu ultrapassou os limites da livre manifestação. Segundo o órgão, para se consumar o delito de ameaça, basta a vítima saber da promessa do agente de lhe causar mal injusto e grave.
Nessa linha argumentativa, de acordo com o MPF, a consumação da ameaça independe da real intenção do agente de cumpri-la. O recorrente acrescentou que Lira declarou ter se sentido intimidado e representou criminalmente contra o réu.
Em relação à injúria, o MPF destacou que o próprio acusado a confessou. Com histórico de internações em hospital psiquiátrico, o réu disse estar arrependido e negou intenção de causar dano ao então presidente da Câmara e de atingir a honra do funcionário.
Processo 1079086-85.2021.4.01.3400
Com informações do Conjur