A Desembargadora Carla Maria Santos dos Reis ao relatar apelação contra sentença condenatória da qual Sinésio Silva se irresignou com o reconhecimento da pretensão punitiva por estupro de vulnerável, deixou esclarecido que o crime, para que se configure, não exige que o ato tenha sido praticado com violência ou grave ameaça à vítima, e que o consentimento da ofendida é irrelevante, pois sendo a vítima menor de 14 anos “não tem o necessário discernimento para a prática do ato”. Foi mantida, também, a condenação da avó que favorecia a prostituição da neta.
Afastou-se, ainda, o pedido de absolvição realizado por Maria Lúcia Silva, condenada por ter atraído à prostituição a menor, vítima do crime, que de maneira continuada fora alvo do reconhecido estupro de vulnerável. Reconheceu-se que, nesta modalidade se operou um triângulo constituído pelo sujeito do estupro, a vítima, pessoa menor de 14 anos, e a ré, que propiciava com que a ofendida fosse mantida à satisfazer a lascívia do primeiro apelante, agindo em troca de dinheiro e comida.
O Artigo 217-A do Código Penal tutela a dignidade sexual da vulnerável. A vulnerabilidade ínsita ao tipo demanda que a vítima tenha menos de 14 anos, seja portadora de enfermidade ou deficiência mental que a torne incapaz de discernimento para a prática do ato, ou que, porque qualquer outra causa, não tenha condições para oferecer resistência, firmou o julgado, definindo que a menoridade, no caso concreto, restou provada na causa examinada.
O julgado evidenciou que a vítima já havia sido abusado sexualmente, quando tinha 6 anos de idade, com o consentimento da avó e que, quanto ao delito praticado pelo recorrente, fora executado de forma repugnante, pois se aproveitava da hipossuficiência econômica da vítima com a promessa de pagamento em espécie ou com alimentos à segunda condenada, que submetia as próprias netas à exploração sexual. As sentenças foram mantidas. A matéria está na jurisprudência do TJAM.
Processo nº 0000217-43.2017.8.04.2400
Leia o acórdão:
Apelação Criminal nº 0000217-43.2017.8.04.2400 Apelantes : Sinésio da Silva Guedes, Maria Lucia Souza APELAÇÃO CRIMINAL. PROCESSUAL PENAL. PENAL. CRIMES DE
ESTUPRO DE VULNERÁVEL E EXPLORAÇÃO SEXUAL. ARTIGOS 217-A E 218-B DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. RELEVÂNCIA DOS DEPOIMENTOS DA VÍTIMA. ELEMENTOS PROBATÓRIOS ROBUSTOS E SUFICIENTES. DOSIMETRIA DE PENA. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. AUSÊNCIA DE TERATOLOGIA. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O recurso de apelo criminal é caso típico de recurso ordinário por proeminência, tutelado por todos os arcabouços jurídicos modernos, marcado pela possibilidade de ampla devolução de cognição ao Juízo ad quem, sendo, também, reconhecido como garantia processual de instrumentalização do princípio implícito constitucional do duplo grau de jurisdição.
2. Na vertente hipótese, os recursos foram interpostos voluntariamente e fulcrados no artigo 593, inciso II, do Código de Processo Penal, visando combater o decisum prolatado pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Atalaia do Norte/AM, que condenou o Apelante Sinésio da Silva Guedes pela prática da infração tipificada no art. 217-A, c/c art. 71, do Código Penal, bem como a Apelante Maria Lúcia Souza da Silva à pena de 04 (quatro) anos e 10 (dez) meses de reclusão e multa, como incursa no art. 218-B, §1º do
CP. 3. Apelado SINÉSIO: Consoante os elementos informativos e probatórios carreados aos autos, há a certeza de que os fatos detalhadamente narrados na denúncia, os quais atribuem ao Apelante a prática do crime de estupro de vulnerável contra a vítima menor realmente se consumou. 4. A prescindibilidade do Exame de Corpo de delito ou de laudo pericial que indique a existência de vestígios é ratificada pelo sistema do livre convencimento motivado ou da persuasão racional (art. 93, IX, da CF e art. 155
do CPP), pois o magistrado tem ampla liberdade na valoração das provas constantes dos autos, desde que o faça de forma motivada. 5. A consumação do delito de estupro de vulnerável é irrelevante o fato de a conjunção carnal ter sido praticada com/sem violência ou ameaça, ou seja, de ter sido consentida, pois o sujeito passivo, por apresentar qualidade ou condição especial de vulnerabilidade exigida objetivamente pelo tipo penal (no caso emtela, a menoridade de quatorze anos), “não tem o necessário discernimento
para a prática do ato”