A 1ª Vara Federal de Ijuí (RS) reconheceu o direito de uma mulher em receber o salário-maternidade. Na sentença, a juíza federal Clarides Rahmeier analisou o caso a partir da legalidade e da perspectiva de gênero, constatando que ela atendia aos requisitos exigidos para o recebimento do benefício ao exercer atividade rural em regime de economia familiar.
Em junho de 2023, a mulher de 44 anos ingressou com ação narrando que solicitou ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em fevereiro do ano passado, a concessão do salário-maternidade, o qual foi negado sob o argumento de que faltava comprovação da atividade rural nos dez meses anteriores ao parto. Afirmou que a autarquia previdenciária não considerou as notas fiscais de produtor rural, a autodeclaração de segurada especial rural e as certidões de nascimento e óbito da criança.
A autora afirmou que vive em união estável com seu companheiro desde 2016, residindo com ele num assentamento localizado no interior do município gaúcho de Jóia e que eles exercem a atividade rural em regime de economia familiar.
Ao analisar o caso, a juíza pontuou que, de acordo com a Lei nº 8.213/1991, o salário-maternidade é devido durante 120 dias, com início previsto até no máximo 28 dias antes do parto. Para a concessão do benefício, é necessário que a requerente tenha cumprido dez contribuições mensais, salvo algumas exceções, como para trabalhadoras rurais em que se exige a comprovação do exercício de atividade rural em igual período.
A magistrada também ressaltou a definição dada pela lei ao regime de economia familiar, sendo aquele em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados. Ela apontou que a maternidade da autora ficou comprovada, sendo que a criança nasceu em dezembro de 2022.
Além disso, para a juíza, a prova documental juntada ao processo atesta o exercício da atividade rural pela mulher mesmo a documentação estando no nome do companheiro, pois é algo frequente quando se trata da trabalhadora rural. Ela ainda observou que as declarações de testemunhas afirmaram que a mulher exerce exclusivamente atividade rural, junto com o cônjuge, na produção de leite e na colheita de soja, milho e outros, sem ajuda de empregados.
Rahmeier ainda salientou que “uma interpretação gramatical da lei, especialmente, no caso, quanto aos requisitos para caracterização do trabalho rural em regime de economia familiar disposto no art. 11 da Lei 8213/91, são empregados conceitos jurídicos vagos e indeterminados, como “regime de economia familiar”, “indispensável à própria subsistência” e “mútua dependência e colaboração”, que em nada contribui para a proteção do trabalho das mulheres, já que, expressamente, em nada reconhece os seus esforços no âmbito doméstico no meio rural como parte dessa colaboração, do qual os demais membros do grupo familiar também são dependentes”. Ela sublinhou que é preciso reconhecer a flagrante desvalorização do trabalho feminino no campo e a dificuldade de sua comprovação.
“De forma corriqueira e inconsciente, o labor rural é associado ao homem, exigindo-se, muitas vezes, injustificadamente, das mulheres, uma prova mais robusta para provar que o seu trabalho, que é tão ou mais árduo que o dos homens, pois a maioria esmagadora necessita conciliar suas atribuições laborais no campo com o atendimento das necessidades do trabalho doméstico dentro dos seus lares”, destacou.
A juíza reconheceu o exercício de atividade rural pela autora, devendo o INSS proceder a averbação para efeitos previdenciários e declarando que a mulher tem o direito a receber o salário-maternidade. Cabe recurso às Turmas Recursais.
Fonte TRF 4