A 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) reformou sentença da Comarca de Montes Claros e reconheceu a responsabilidade civil de um shopping center e de uma produtora de espetáculos por desrespeito ao direito de prioridade garantido a pessoas com deficiência.
Ambos foram condenados, de forma solidária, ao pagamento de R$ 7 mil por danos morais a uma mulher com autismo que, junto do filho, também autista, teve negado o acesso preferencial a uma apresentação circense.
De acordo com os autos, a autora da ação relatou que, ao chegar ao local do evento com o filho de 8 anos, foi informada na bilheteria de que bastaria apresentar documentação comprobatória da deficiência para garantir o atendimento prioritário. No entanto, ao tentar acessar a sessão, foi orientada por um funcionário do circo a adquirir ingressos e dirigir-se ao final da fila. Diante da espera e do constrangimento, mãe e filho perderam o horário da sessão pretendida.
A decisão de 1º grau havia julgado improcedente o pedido, sob o fundamento de que não houve comprovação de dano relevante, já que os dois assistiram à apresentação em horário posterior. A consumidora recorreu da sentença.
Ao analisar o recurso, o relator, desembargador Lúcio Eduardo de Brito, reverteu a decisão. Em voto contundente, afirmou que o episódio provocou impacto emocional relevante, sobretudo diante da condição neurológica dos envolvidos. Segundo o magistrado, “essas características, por si só, são incapacitantes, justificando os incentivos legais concedidos às pessoas autistas, incluindo o direito ao acesso preferencial”.
Para o relator, a situação vivida pela autora não apenas frustrou o exercício de um direito legalmente assegurado, mas intensificou sensações de exclusão social. “A carga aversiva da situação, na qual a paciente foi submetida a constrangimento público, intensificou crenças disfuncionais relacionadas à impossibilidade de levar uma vida comum entre os normotípicos”, pontuou.
Outro ponto de destaque foi a rejeição do argumento do shopping, que tentava se eximir da responsabilidade sob a alegação de apenas ter cedido o espaço à produtora do evento. A tese foi afastada com base no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que impõe a responsabilidade solidária aos integrantes da cadeia de fornecimento de serviços.
A decisão firmou entendimento de que a violação à prioridade legal não se restringe a aspectos operacionais, mas envolve diretamente a dignidade da pessoa com deficiência, em especial quando o desrespeito ocorre em ambientes públicos voltados ao lazer, nos quais o acolhimento deveria ser a regra.
Acompanharam o voto do relator os desembargadores Maurílio Gabriel e Antônio Bispo.