Justiça anula ação penal por tráfico de drogas com provas obtidas em busca pessoal irregular

Justiça anula ação penal por tráfico de drogas com provas obtidas em busca pessoal irregular

 O Desembargador José Hamilton Saraiva, do TJAM, invocou o princípio de que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal associado a vedação da obtenção de provas ilícitas e manteve a rejeição de uma ação penal por tráfico de drogas sem que o acusado estivesse em circunstãncias que evidenciassem a justa causa para a busca e apreensão pessoal realizada pelos militares.

Sem fundadas razões não cabe aos agentes de polícia procederem a busca pessoal com base na intuição. O tema foi examinado pelo Magistrado por meio de um recurso contra decisão da Juíza Rosália Guimarães Sarmento, da 2ª Vecute, que rejeitou denúncia do Promotor de Justiça Mário Ypiranga Monteiro Neto, por entender que a peça acusatória esteve lastreada em provas ilícitas.

A Juíza dispôs que a denúncia, se recebida, comprometeria direitos e garantias individuais, pois o acusado foi preso em flagrante delito porque o policial evidenciou um estado de nervosismo do suspeito ao ter este avistado a viatura, momento em que passou a vistoriá-lo e com o ‘suspeito’ encontrou alguns pacotes de substâncias entorpecentes.

Quando o CPP menciona a fundada suspeita ou justa causa, com a qual se deva pautar as diligências dos agentes investigadores, a ação ( a busca) deve restar baseada num juízo de probabilidade,necessitando para  sua comprovação de uma descrição minuciosa dos fatos de forma objetiva, justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto, enfatizou o Magistrado.

No caso examinado o suspeito somente foi abordado pela polícia em decorrência da reação de nervosismo frente à presença de policiais, ou seja, em desarmonia ao disposto no art. 244 do Código de Processo Penal, quando menciona a fundada suspeita, justa causa, a qual deve ser baseada num juízo de probabilidade. Segundo o acórdão, a suspeita somente ocorreu  porque os investigados,  ao perceberem a presença da viatura da Rocam aparentaram nervosismo, ocasião em que foram abordados e revistados.
 
“Portanto, pode-se notar que a prisão em flagrante dos denunciados se deu mediante interpretação subjetiva do policial que entendeu que os denunciados estariam em atitude suspeita”, sem narrativa concreta de circunstâncias que motivassem diligências prévias a autorizar a medida administrativa de constrição pessoal. Manteve-se a conclusão de que houve nulidade das provas obtidas por meio ilícitos, com a rejeição da denúncia. 
 

0217765-14.2020.8.04.0001   

Classe/Assunto: Recurso em Sentido Estrito / Tráfico Ilícito de Drogas praticado por Funcionário Público
Relator(a): José Hamilton Saraiva dos Santos
Comarca: Manaus
Órgão julgador: Primeira Câmara Criminal
Data do julgamento: 28/10/2023
Data de publicação: 28/10/2023
Ementa: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PROCESSO PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ART. 33, CAPUT, DA LEI N.º 11.343/2006. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NULIDADE DA BUSCA PESSOAL. AVERIGUAÇÃO MOTIVADA PELA PERCEPÇÃO DE NERVOSISMO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 244 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. DECISÃO A QUO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. A questão sob análise está circunscrita à presença ou não de justa causa capaz de fundamentar o recebimento da Denúncia ofertada pelo Parquet Estadual, em desfavor dos Recorridos pelo delito de Tráfico Ilícito de Entorpecentes, tipificado no art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006. 2. A justa causa é condição imprescindível para o ajuizamento da ação penal, pois, em um ordenamento jurídico de direito penal mínimo, o Estado só poderá lançar mão do seu jus accusationis quando existir lastro probatório mínimo de materialidade e indícios suficientes de autoria em relação ao delito, em tese, perpetrado pelo Acusado. 3. In casu, infere-se dos Autos que os Acusados foram abordados em decorrência da reação de nervosismo frente à presença de policias, ou seja, em desarmonia ao disposto no art. 244 do Código de Processo Penal, quando menciona a fundada suspeita, justa causa, a qual deve ser baseada num juízo de probabilidade, necessitando à sua comprovação uma descrição minuciosa dos fatos de forma objetiva, justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto. 4. De fato, a busca pessoal sem mandado, como medida autônoma, depende da presença de fundada suspeita da posse de objetos que constituam corpo de delito. Dessa forma, não é suficiente a mera conjectura ou desconfiança acerca da posse, isto porque a suspeita deve ser amparada em circunstâncias objetivas, no entanto, no presente caso, a abordagem e a revista pessoal deu-se em face dos Acusados apresentarem um “certo nervosismo” com a aproximação da viatura da Polícia Militar da Ronda Ostensiva Cândido Mariano – ROCAM, situação, esta, que não autoriza a realização da busca pessoal sem mandado. 5. A propósito: “a percepção de nervosismo do averiguado por parte de agentes públicos é dotada de excesso de subjetivismo e, por isso, não é suficiente para caracterizar a fundada suspeita para fins de busca pessoal, medida invasiva que exige mais do que mera desconfiança fundada em elementos intuitivos.” (STJ – Resp n.º 1.961.459/SP, Relatora Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, Julgado em 05/04/2022, Publicado no Dje do dia 08/04/2022). 6. Nesses termos, de acordo com hodierna jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta ínclita Corte de Justiça, vislumbra-se que as justificativas apresentadas pelos Policiais Militares a amparar a abordagem e revista pessoal não são idôneas, visto que consideraram impressões subjetivas não satisfazendo as imposições elencadas no artigo 244 do Código de Processo Penal. Assim sendo, “certo nervosismo” não autoriza a violação à intimidade dos Recorridos, razão pela qual, a decisão de piso deve permanecer irretocada. 7. Recurso em Sentido Estrito CONHECIDO e DESPROVIDO.
 
 

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