Juiz erra ao não intimar parte após deferir gratuidade de justiça apenas parcialmente

Juiz erra ao não intimar parte após deferir gratuidade de justiça apenas parcialmente

Tendo sido a gratuidade da justiça pedida pelo autor, em ação judicial, mormente quando busca combater descontos indevidos contra uma instituição bancária e o juiz a defere apenas em parte, não intimando previamente o interessado a convencê-lo de que teria total procedência a autodeclaração de não poder suportar na totalidade as despesas do processo, permite que o interessado demonstre, via recurso, que possa o juiz estar incidindo em afronta ao direito do interessado, que pode obter a reforma da decisão agravada em segunda instância. O contexto é abordado pela Desembargadora Maria do Perpétuo Socorro, em voto condutor de julgado no Tribunal do Amazonas. 

No caso concreto, o autor pediu a gratuidade da justiça numa ação em que instaurou  discussão jurídica contra o Banco do Brasil sobre cobranças acerca de uma dívida que considera inexigível, ante irregularidades que assacou existentes e com registros em seu nome à titulo de “B BRASIL EMPR”. 

Na decisão recorrida, o magistrado singular deferiu apenas parcialmente a gratuidade da  justiça, exigindo o pagamento de despesas postais e pesquisas eletrônicas por serem de pequena monta. Ocorre que, o escopo correto do instituto, para ser aplicado no caso concreto, exigiria, aos olhos do agravante, que lhe fosse deferida a gratuidade da justiça na sua totalidade. 

Em segunda instância concluiu-se que o magistrado recorrido errou, sendo nula a sua decisão, pois, deferiu o benefício da gratuidade da justiça apenas parcialmente, fazendo referência a fundamentação que, contudo, não constou no decisório, não havendo, também, qualquer ponderação no ato decisório atacado que lastreasse a concessão tão somente parcial da justiça gratuita. 

Ademais, o caderno processual atacado revelou que o deferimento parcial da gratuidade da justiça não foi precedido de intimação para que o demandante se pronunciasse acerca de elementos de informação específicos que se mostrassem capazes de infirmar a presunção que assiste a quem se autodeclara economicamente hipossuficiente. 

Processo 4009150-80.2022.8.04.0000

Leia a decisão:

Agravo de Instrumento / Defeito, nulidade ou anulação. Relator(a): Maria do Perpétuo Socorro Guedes Moura. Comarca: Manaus. Órgão julgador: Segunda Câmara Cível. Data do julgamento: 24/04/2023. Data de publicação: 24/04/2023. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU APENAS PARCIALMENTE A JUSTIÇA GRATUITA E INDEFERIU LIMINAR DE SUSPENSÃO DE DESCONTOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM CONTRACHEQUE. NULIDADE DA DECISÃO EM RELAÇÃO À CONCESSÃO PARCIAL DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA. REUNIDOS ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO SUFICIENTES PARA AVALIAR O PEDIDO DE GRATUIDADE, ADMITE-SE SUA APRECIAÇÃO IMEDIATA. PRECEDENTES. INSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DEMONSTRADA. JUSTIÇA GRATUITA INTEGRAL DEVIDA. LIMINAR DE SUSPENSÃO DE DESCONTOS INDEVIDA POR AUSÊNCIA DE EVIDÊNCIAS A AMPARAREM A TESE DE QUE O RECORRENTE NÃO CONTRATOU O EMPRÉSTIMO. PERIGO NA DEMORA INCERTO, PORQUANTO O DEMANDANTE SUPORTA OS DESCONTOS, NO MESMO VALOR, DESDE MAIO DE 2020. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, TÃO SOMENTE PARA CONCEDER AO RECORRENTE A JUSTIÇA GRATUITA INTEGRAL. 1. A decisão recorrida assoma nula, na medida em que deferiu a gratuidade apenas parcialmente, fazendo referência a fundamentação anterior que, contudo, não consta do decisório, isto é, no decisum não se encontra qualquer ponderação que lastrei a concessão tão somente parcial da justiça gratuita. 2. Fosse insuficiente, consulta ao caderno de piso revela que o deferimento parcial da gratuidade não foi precedido de intimação para que o demandante se pronunciasse acerca de elementos de informação específicos que se mostrassem capazes de infirmar a presunção que assiste a quem se autodeclara economicamente hipossuficiente (art. 99, §3º, do CPC), restando contrariada, deste modo, a exigência de prévia intimação do art. 99, §2º, do CPC. 3. Havendo, porém, sido reunidos elementos de informação suficientes nestes autos recursais que permitem avaliar a condição econômica do Recorrente, é devida a apreciação, desde já, da concessão do benefício. Precedentes. 4. O cotejo dos contracheques colacionados pelo Recorrente (fls. 15/34) com seus comprovantes de gastos (fls. 40/45), revelam que seus ganhos são inferiores a seus gastos, e, assim, demonstram hipossuficiência econômica que ancora a concessão da gratuidade de justiça total. 5. Não é porque é impossível para o autor de uma ação parte provar um fato negativo por si alegado sem que o réu seja chamado a trazer elementos de informação que, teoricamente, se acham em seu poder, que se há de presumir verdadeira a narrativa autoral. Há, em verdade, enquanto não estabelecido o contraditório, apenas dúvida, só se cogitando de presunção de veracidade da narrativa autoral, data venia, em caso de revelia (art. 344, do CPC). 6. Fosse insuficiente, convém recordar que a demonstração do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo que condiciona a tutela de urgência (art. 300, caput, do CPC) pressupõe a iminência ou agravamento de um risco/dano a ser suportado caso a liminar não seja concedida, sendo que, na espécie, tem-se dos documentos juntados (notadamente os contracheques de fls. 15-34) que o Agravante suporta os descontos questionados – no mesmo valor – desde, ao menos, maio de 2020 (fls. 26), não restando configurada, destarte, salvo melhor juízo, a premência que marca o periculum in mora. 7. Recurso conhecido e parcialmente provido.

 

 

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