A discricionariedade técnica da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, disciplinada em seu Código de Boas Práticas, está longe de se sobrepor aos direitos fundamentais e à dignidade da pessoa humana.
Com base nesse entendimento, o juiz Herley da Luz Brasil, da 2ª Vara Federal Cível e Criminal do Acre, determinou que o IBGE inclua campos sobre orientação sexual e identidade de gênero no Censo de 2022. Conforme a decisão, o órgão terá 30 dias para explicar como vai adequar os seus questionários.
A decisão foi provocada por ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público. Em suas alegações, o IBGE afirmou que a Justiça Federal já referendou os argumentos técnicos do IBGE para não inclusão dos campos, quando do julgamento da Ação Civil Pública 5019543-02.2018.4.02.5101.
Na ocasião, a Defensoria Pública da União requereu a contagem da população transexual, no censo de 2020, e o pleito foi julgado improcedente nos dois graus de jurisdição, tendo alcançado o status de coisa julgada.
Ao analisar o caso, o juiz inicialmente afastou a alegação do IBGE. Ele entendeu que a coisa julgada operada na Ação Civil Pública 5019543- 02.2018.4.02.5101 não prejudica o conhecimento da atual ação já que não são idênticas.
“Neste caso, quanto às partes, o critério não se aplica porquanto a legitimação da ação coletiva tem característica de disjuntiva, de modo que, apesar de concorrente, cada um dos legitimados atua independentemente da vontade e da autorização dos demais. Ainda assim, o polo ativo das duas ações é diverso, pois enquanto na primeira figurava a Defensoria Pública da União, nesta o Ministério Público Federal é o autor”, apontou o juiz Herley da Luz Brasil.
O julgador ainda apontou que um dos argumentos que levou à improcedência da primeira ação foi o de que, àquela época, o IBGE não contava com nenhuma metodologia viável para atender o pedido, nem no âmbito nacional, nem no internacional. “Ocorre que, já no ano de 2021, a Inglaterra e o País de Gales criaram e aplicaram metodologias próprias em seus censos, aptas a quantificarem a população LGBTQIA+”, ponderou.
Por fim, ele apontou a omissão do Estado em relação a população LGBTQIA+ e pontuou que o próprio IBGE reconhece que o Censo 2022 é o instrumento que permite traçar um retrato abrangente, detalhado e fiel do país.
“De modo que a inclusão de quesitos referentes à identidade de gênero e orientação sexual na PNS–2019 é louvável, mas não tem o condão de excluir a importância destas indagações no censo demográfico brasileiro”, resumiu ao determinar a inclusão dos campos requeridos pelo MP já em 2022.
Fonte: Conjur