Na denúncia o Ministério Público narrou que o réu abordou a vítima em área pública e fez insinuações sobre sua vida conjugal, alegando que a mesma carregava coisas ruins, e que se ela permitisse, poderia ajudar. No mesmo dia, ele foi até a residência da mulher e, enquanto distraiu o marido dela, inseriu-se no quarto da vítima. Esta relatou que, de forma libidinosa, o ofensor tentou fazer acreditar que a cura adviria de um ato sexual com ele.
Com o depoimento da vítima, a de que o falso curador espiritual tocou em suas partes íntimas sem seu consentimento, o Promotor de Justiça ofertou denúncia pela prática de invasão de domicílio e estupro, na modalidade tentada. O Juiz discordou.
A condenação
Com decisão do Juiz Danny Rodrigues Moraes, da Comarca de Ipixuna, um homem denunciado por abordar a vítima e fazer insinuações sobre sua vida conjugal, findou sendo condenado por importunação sexual. A sentença veio por desclassificação da acusação do Promotor de Justiça, que imputou ao acusado os crimes de invasão de domicílio e estupro. Com a sentença, o Ministério Público recorreu.
Os fundamentos da decisão
Para a desclassificação, o Juiz considerou que durante a audiência de instrução e julgamento, várias testemunhas corroboraram a versão da vítima, a de que tomaram conhecimento que o acusado, de fato, havia tocado as pernas e as partes íntimas da ofendida, porque tentava justificar seu comportamento com explicações sobre “curas espirituais”.
Apesar disso, a defesa do réu argumentou que a vítima havia gravado um vídeo posteriormente, alegando que o réu “não lhe fez mal”. O juiz ponderou, no entanto, que não seria possível atestar a espontaneidade da gravação, uma vez que ela foi realizada com a ajuda de terceiros e sem que se revelasse o nome da pessoa que teria causado o mal à vítima.
A desclassificação
O juiz fundamentou que, muito embora a palavra da vítima tenha especial relevância, uma vez que a maioria dos crimes de violência sexual ocorra em locais privados e sem testemunhas, deve ser observado detidamente cada uma das circunstâncias que envolvem a questão, mormente se cuidando de pessoas maiores e capazes e a ausência de vulnerabilidades a serem consideradas, como se delineava na causa criminal do caso em julgamento.
Ele também enfatizou a harmonia entre os depoimentos das testemunhas, que descreveram de forma consistente os atos do acusado, porém, permitiam o convencimento de que os fatos se definiam pela existência de ilícito diverso do estupro.
De acordo com a análise do juiz, embora o acusado tenha praticado um ato libidinoso, sem o consentimento da vítima, não houve, deveras, o uso de violência ou grave ameaça, requisitos essenciais para a configuração do crime objeto da denúncia do Ministério Público.
Assim, desclassificou a acusação para importunação sexual, conforme previsto no artigo 215-A do Código Penal, que descreve a prática de ato libidinoso sem a presença de elementos mais graves. O crime de estupro é configurado quando o agente constrange a vítima, mediante violência ou grave ameaça, a praticar conjunção carnal ou outro ato libidinoso.
A falta de elementares do estupro
No caso, o réu apalpou as partes íntimas da vítima com o objetivo de satisfazer sua lascívia, mas sem violência ou ameaça, surpreendendo a vítima em momento de distração. De acordo com a jurisprudência, “comete o crime de importunação sexual quem realiza ato libidinoso sem o consentimento da vítima, com ou sem contato físico, mas de forma visível e identificável.
A ausência de violência ou grave ameaça desclassifica a conduta do réu para o crime de importunação sexual, previsto no art. 215-A do Código Penal. Afinal, o réu teria usado de uma ‘fraude’, para atrair a vítima e satisfazer sua lascívia.
A absolvição pela invasão de domicílio
Quanto ao delito de invasão de domicílio, o magistrado entendeu que houve um crime meio, para atingir um crime fim, no caso, a importunação sexual, absolvendo o réu da imputação do delito descrito no artigo 150 do CP. Com a decisão, o réu foi condenado a dois de reclusão em regime aberto. Não satisfeito, o Ministério Público recorreu, e o caso ainda será reavaliado pelo Tribunal do Amazonas.