Investidas mal sucedidas e vingança da vítima do estupro não evidenciadas mantêm pena no Amazonas

Investidas mal sucedidas e vingança da vítima do estupro não evidenciadas mantêm pena no Amazonas

O Desembargador João Mauro Bessa, do Tribunal do Amazonas, negou pedido de revisão criminal em condenação por estupro, rejeitando o fundamento da desconstituição da coisa julgada penal, que consistiu na alegação de que a vítima pretendeu incriminar o acusado, tanto que, tão logo restou condenado, a ofendida teria publicado no Facebook, em sua conta: “toda mulher tem um esquema engatilhado para qualquer vacilo do cara”, ao qual a ofendida comentou “sempre tenho”, o que aos olhos do revisionando Cleives Almeida seria um fato novo a fundamentar o pedido de absolvição.

Ademais, o julgado lecionou que, no julgamento da revisão criminal, quanto à analise da prova, eventual dúvida no julgamento da ação, já não é mais solucionada em favor do réu, ou seja, o in dubio pro reo tem incidência no transcorrer do processo original. No pedido revisional, quando já se tem, necessariamente, uma sentença com trânsito em julgado, a dúvida que possa surgir é resolvida no sentido de se manter a decisão atacada. A dúvida se resolve a favor da sociedade ou em favor da coisa julgada (in dubio pro re judicata).

O Revisionando alegou que havia sido desconsiderado uma perícia realizada na pessoa da vítima em agosto de 2014, onde o laudo atestou que a paciente era virgem, e se acolheu, diversamente, um laudo realizado mais de doze meses depois, o que levou a sua condenação com depoimentos tendenciosos da vítima e de sua representante legal, com o intuito de prejudicá-lo, o que teria se evidenciado com a publicação da declaração pela vítima na rede social face book dos dizeres contidos em imagens de publicação que levou aos autos, nos quais a vítima comemorava sua condenação. 

O requerente pretendeu crer que a vítima tentou prejudicá-lo por motivo de vingança, face a rejeição que demonstrou ante suas investidas, fundamentando que a mesma teve em sua mente a pretensão de  alguma relação com a sua pessoa, mas que teria rejeitado as suas investidas. 

O Ministério Público, levado a opinar, emitiu parecer firmando que a Revisão mereceria conhecimento parcial, com parcial procedência da ação, no sentido de não considerar o laudo pericial  que foi realizado com distância de mais de 1 ano após o fato, porém que se mantivesse a condenação com base nos demais elementos probatórios colhidos durante a persecução penal. 

O julgado determinou que o laudo utilizado para a condenação fosse excluído para fins de prova da materialidade delitiva, porém embora detectada a controvérsia entre os laudos, concluiu que a condenação não se sustentou exclusivamente na prova técnica, mas em outros elementos probatórios, especialmente no depoimento pessoal da vítima firme e coerente ao relatar o abuso sexual sofrido enquanto tinha 12 anos de idade, bem como no laudo psicossocial, este coletado à época dos fatos, e que indicou fatores materiais do crime. 

O Julgamento afastou desta forma a alegação de que a condenação tenha sido prolatada com provas contrárias aos autos , e que as elementares do tipo penal descrito no Artigo 217-A do CP se firmaram bem definidas. Nos crimes contra a dignidade sexual a palavra da vítima assume preponderante importância, se coerente e em consonância com as demais provas, firmou. 

Conquanto tenha o revisionando se esforçado em demonstrar uma condenação contrária a prova dos autos ou produção de nova prova, ou a falsidade de depoimentos, não se detectou elementos hábeis a desconstituir o julgado, além de que, no estágio processual da coisa julgada, ainda que a negativa de autoria do requerente conduzisse à dúvida, não tem o condão de inclinar a uma absolvição, porque vigora, nessa fase,  o principio in dubio pro judicata.

Processo nº 4008004-38.2021.8.04.0000

Leia o acórdão:

CÂMARAS REUNIDAS REVISÃO CRIMINAL PROCESSO N.º: 4008004-38.2021.8.04.0000. Requerente: Cleives Almeida. Relator: João Mauro Bessa. REVISÃO CRIMINAL – ESTUPRO DE VULNERÁVEL – HIPÓTESES DE CABIMENTO – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO NOS AUTOS – CONDENAÇÃO CRIMINAL SUFICIENTEMENTE FUNDADA NO ACERVO PROBATÓRIO PRODUZIDO DURANTE A INSTRUÇÃO PROCESSUAL – REDISCUSSÃO DE MATÉRIA FÁTICA E PROBATÓRIA – DOSIMETRIA – AUSÊNCIA DE PATENTE ILEGALIDADE – AÇÃO REVISIONAL – SUCEDÂNEO RECURSAL – IMPOSSIBILIDADE – AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. 1. A análise do pedido de revisão criminal será possível desde o pleito revisional esteja
fundamentado em uma das hipóteses taxativamente previstas no artigo 621 do Código
de Processo Penal. 2. O revisionando fundamenta seu pedido na hipótese de cabimento prevista nos incisos I, II e III, do artigo 621, do Código de Processo Penal, alegando que a condenação (a) é contrária à evidência dos autos, uma vez que se baseou em perícia médica realizada mais de 12 (doze) meses após o fato; (b) baseada em depoimento tendenciosos e falaciosos da vítima e de sua avó com o objetivo de prejudicá-lo; (c) superveniência de fato novo que comprova que a acusação se deu por motivo de vingança, face a rejeição do requerente ante as investidas da vítima, todas razões pelas quais requer a reforma da sentença para que seja absolvido do crime imputado ou, subsidiariamente, (d) seja reconhecida a diminuição da pena imposta ao condenado, considerando flagrante error in judicando na fixação da pena-base. 3. As alegações apresentadas se mostram desprovidas de força para desconstituir a decisão transitada em julgado, a teor do artigo 621 do Código de Processo Penal, não permitindo o almejado acolhimento do pleito, pois o juízo condenatório se encontra devidamente fundamentado relativamente à autoria delitiva atribuída ao agente, na medida em que o depoimento da vítima se mostrou firme e coerente ao relatar o abuso sexual sofrido quando ainda possuía a tenra idade de 12 (doze) anos. Tal relato foi corroborado pelo laudo psicossocial, que afirmou que a vítima apresentava comportamentos e sintomas próprios de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual, tais como tristeza, revolta, corrimento e coceira. 4. Post genérico compartilhado em rede social, não possui o condão de desconstituir o juízo condenatório imposto, tendo em vista que pode dizer respeito a qualquer evento, bem como não há qualquer elemento que indique que a vítima tenha sido induzida a incriminar o revisionando. 5. O requerente não logrou êxito em comprovar uma condenação contrária à prova dos autos ou produção de prova nova, bem como a falsidade dos depoimentos ou do laudo psicossocial, de modo que não há elementos hábeis a desconstituir o juízo condenatório imposto, o qual já se encontra abarcado pelo manto da coisa julgada. 6. No presente estágio processual, ainda que a negativa de autoria do requerente conduzisse à dúvida, não possuiria força para o reconhecimento da absolvição, tendo em vista incidir o princípio in dubio pro re judicata, justamente em razão da operação da coisa julgada  material: 7. Quanto à insurgência em relação ao cálculo dosimétrico, o magistrado fundamentou de forma concreta a motivação para a exasperação da pena-base em razão da negativação da circunstância culpabilidade, não havendo em que se falar em patente
ilegalidade, de modo que se torna inviável a pretensão para diminuir a pena aplicada,
porquanto maneja o instrumento revisional, como sucedâneo recursal. 8. Consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça, a revisão criminal não poder ser utilizada como um sucedâneo recursal, na medida em que a desconstituição de uma condenação criminal transitada em julgado constitui medida excepcional. 9. Revisão Criminal julgada improcedente.

 

 

 

 

 

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