Os bens jurídicos tutelados pelo Direito Penal Militar são diferentes daqueles protegidos pelo Direito Penal comum, exatamente pelo devido respeito à hierarquia e à disciplina. Assim, o Pleno do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo decidiu que o decreto de indulto natalino assinado no último ano pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não se aplica aos crimes militares.
O caso foi encaminhado ao Pleno pela 1ª Câmara da Corte, devido a um pedido do Ministério Público estadual em uma execução penal, relativa a um sargento da Polícia Militar condenado a dois anos de detenção por fraude processual durante o serviço.
O advogado do réu solicitou a aplicação do decreto de Bolsonaro, cujo artigo 5º concedeu indulto natalino a todas as pessoas condenadas por crimes cuja pena não seja superior a cinco anos. O juiz das execuções criminais acolheu o pedido.
O MP, então, requereu a declaração de inconstitucionalidade incidental do artigo 5º do decreto — por considerá-lo genérico, abstrato e excessivamente abrangente —, com a consequente anulação da decisão.
No Pleno do TJM-SP, o juiz relator, Enio Luiz Rossetto, explicou que a generalidade do artigo 5º viola os princípios constitucionais da hierarquia e da disciplina, nos quais se baseiam as instituições militares e o Direito Penal Militar. Para ele, o dispositivo “coloca em xeque e provoca o total desmantelamento e a plena corrosão desse sistema”.
Ao permitir o indulto de militares condenados por crimes militares, o decreto abrangeu delitos graves contra a autoridade ou disciplina militar, como desrespeito a superior, violência contra superior, violência contra militar de serviço, recusa de obediência, publicação ou crítica indevida, deserção, descumprimento da missão, apologia de fato criminoso ou de seu autor e incitação à desobediência, à indisciplina ou à prática de crime militar.
O indulto também beneficiou autores de crimes contra a honra de superiores hierárquicos, como calúnia, difamação e injúria; de crimes contra a administração militar, como desacato a militar, desacato a superior e desobediência; e de crimes contra a administração da Justiça Militar, como comunicação falsa de crime, autoacusação falsa, favorecimento pessoal e favorecimento real.
“Com a concessão de indulto, tais normas penais militares ficam enfraquecidas”, concluiu Rossetto, ao declarar a inconstitucionalidade parcial do artigo 5º e afastar sua aplicação à seara penal militar.
Leia o acórdão
Processo 0900177-52.2023.9.26.0000
Com informações do Conjur