É dever do Estado proteger a pessoa que, sob custódia, tem a sua liberdade perdida, ainda que por decisão de um juiz. A Desembargadora Onilza Abreu Gerth relatou recurso cujo julgamento ante a Segunda Câmara Cível do TJAM, declarou a obrigação do Estado do Amazonas de indenizar uma menor de idade na razão de que o pai foi morto dentro do COMPAJ, no dia 01/01/2017, vítima de diversas agressões e estocadas de arma branca por parte de outros detentos. A vítima da violência, Raijean Encarnação Medeiros, aguardava preso o desfecho do processo movido pelo Ministério Público.
Ao julgar o pedido em primeira instância, o Juiz Ronne Frank Torres Stone reconheceu a responsabilidade objetiva do Estado. Na contestação o ente estatal levantou a tese de que, no caso concreto, a morte decorrente de disputa entre facções criminosas, dentro do sistema prisional, estaria entre os fatos nos quais não seria possível a intervenção do Estado no sentido de garantir direitos fundamentais. Ou seja, não seria possível ao Estado ter evitado a rebelião e por consequência, as mortes, ainda que adotasse todas as precauções.
Ronne Frank, diversamente, concluiu que “o Estado possui um dever de guarda e incolumidade sobre o preso, devendo protegê-lo de abusos perpetrados por seus pares e pelos próprios policiais, e respondendo pelos danos eventualmente causados”. É a hipótese de que o Estado deva observar dever específico como guardião de todos os direitos do preso não atingidos pela perda da liberdade. Foram fixados danos morais à autora no valor de R$ 60 mil.
Inconformado com a decisão o Estado recorreu e contrariou a sentença, pedindo a sua reforma. Na Corte de Justiça a sentença foi confirmada, com reparos somente nos valores dos danos morais que foram reduzidos. Noutros aspectos, se reconheceu ser a sentença irretocável, mormente porque seja ‘direito fundamental do preso condenado ou provisório, o respeito a sua integridade física e moral.
Processo nº 0678692-41.2021.8.04.0001
Leia a decisão:
RELATOR: Onilza Abreu Gerth. APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MORTE DE DETENTO EM UNIDADE PRISIONAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, PELO ESTADO, DE CAUSA IMPEDITIVA DA SUA ATUAÇÃO PROTETIVA, DE MODO A ROMPER O NEXO DE CAUSALIDADE COM O RESULTADO DANOSO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DEVIDA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO SOMENTE PARA MINORAR O VALOR DA INDENIZAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. Indenização em decorrência do falecimento de detento nas dependências do Complexo Penitenciário Anísio Jobim – Compaj; 2. Há responsabilidade civil do Estado quando haja morte de detento, respondendo o Estado objetivamente nos casos em que haja inobservância do dever legal de proteger a integridade física do preso sob sua custódia, previsto no art. 5.º, XLIX, da Constituição Federal; 3. No caso sob julgamento, entendo que o Poder Público não comprovou qualquer causa impeditiva da sua atuação protetiva em relação ao detento falecido, de modo que não apresentou provas capazes de romper o nexo de causalidade da sua omissão com o resultado danoso; 4. Por expressa disposição constitucional, é dever do Estado garantir a vida de seus detentos, mantendo vigilância eficiente. Morto o preso no interior da cadeia, responde o Estado pelo evento danoso, independentemente da culpa do agente público; 5. O quantum indenizatório no montante de R$50.000,00 (cinquenta mil reais) devidos em favor da Apelada revela-se o mais adequado, posto que a fixação da indenização por dano moral não pode ser inexpressiva, nem ser motivo de enriquecimento ilícito; 6. Sentença parcialmente reformada somente para minorar o valor dos danos morais devidos à Requerente.pelação Cível / Indenizações Regulares.