A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto por empresa multada por ato atentatório à dignidade da Justiça em virtude de não comparecer a uma audiência de conciliação. Por unanimidade, o colegiado considerou que a penalidade não poderia ter sido aplicada, já que a empresa foi representada na audiência por advogado com poderes para transigir.
Relator do recurso, o ministro Raul Araújo entendeu que, embora o artigo 334, parágrafo 8º, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) considere a ausência injustificada na audiência de conciliação como ato atentatório à dignidade da Justiça, o parágrafo 10 do mesmo dispositivo legal faculta à parte constituir representante com poderes para negociar e transigir.
De acordo com os autos, após ter sido multada em cerca de R$ 29 mil (2% sobre o valor da causa) por não ter comparecido à audiência, a empresa interpôs recurso contra a decisão, o qual não foi conhecido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) sob o fundamento de que não há previsão legal de recurso contra decisão que aplica a referida multa.
Direito líquido e certo
A recorrente impetrou mandado de segurança, alegando possuir direito líquido e certo de se fazer representar por advogado em audiência de conciliação, conforme o CPC/2015. No entanto, o TJMS indeferiu a petição inicial do mandado por esgotamento do prazo para a impetração.
O ministro Raul Araújo considerou tempestivo o mandado de segurança, por entender que não foi ultrapassado o prazo legal entre o não conhecimento do recurso contra a multa e a impetração. O relator também acolheu o argumento da recorrente de que não poderia contestar a multa por meio de apelação, pois a sentença lhe foi favorável.
“Inexistindo recurso contra a decisão interlocutória que aplicou multa por ato atentatório à dignidade da Justiça, a via do remédio heroico mostrou-se realmente como o único meio cabível contra a decisão, tida por ilegal, proferida pela autoridade coatora. Incabível, inclusive, a ação rescisória, já que esta é direcionada, apenas, contra decisão de mérito transitada em julgado”, explicou o ministro.
Multa manifestamente ilegal
Segundo o relator, a legalidade da multa por não comparecimento à audiência de conciliação decorreria de a conduta ser reprovável a ponto de ser considerada atentatória à dignidade da Justiça. Porém, o ministro apontou que o CPC/2015 faculta à parte constituir representante com poderes para transigir, motivo pelo qual a doutrina considera suficiente a presença deste – que pode ser advogado ou não – para afastar a penalidade.
O ministro citou jurisprudência do STJ no sentido de que a multa é inaplicável quando a parte se faz presente à audiência por meio de representante munido de procuração com outorga de poderes de negociar e transigir. No caso dos autos, o juiz aplicou a multa desconsiderando o fato de que a parte estava representada por advogado com os poderes específicos exigidos pelo CPC/2015.
“Desse modo, ficando demonstrado que os procuradores da ré, munidos de procuração com poderes para transigir, estiveram presentes na audiência, tem-se como manifestamente ilegal a aplicação da multa por ato atentatório à dignidade da Justiça”, concluiu o relator.
Veja a decisão
Fonte: STJ