É possível, em uma ação de reparação de danos movida contra o Estado por falha na prestação de serviços médicos, que o juiz considere a vulnerabilidade aparente do autor e determine que o ente público comprove a regularidade na prestação de serviços de saúde. Isso é especialmente aplicável quando se verifica que o autor enfrentará dificuldades para produzir provas que, a princípio, seriam de sua incumbência e indispensáveis para a instrução do pedido.
Nesse contexto, é dever do Estado, no mínimo, providenciar a juntada do prontuário médico do paciente que esteve internado na rede hospitalar pública, a fim de possibilitar a análise adequada do fato.
Com essa razão de decidir, a Terceira Câmara Cível do Amazonas, com voto do Desembargador Lafayette Carneiro Vieira Júnior, definiu que é cabível a inversão do ônus da prova em favor do paciente quando demonstrada sua hipossuficiência técnica em relação ao hospital, nos termos do art. 373, § 1º, do CPC/2015.
A Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), em julgamento realizado no dia 9 de dezembro de 2024, manteve decisão que determinou a inversão do ônus da prova em uma ação de reparação por danos materiais, morais e estéticos contra a rede hospitalar pública do Amazonas.
O recurso foi interposto pelo Estado do Amazonas contra a medida que considerou a dificuldade da parte autora em acessar documentos médicos relevantes sob a posse dos hospitais públicos nos quais ficou internado para tratamento de um acidente.
Na análise do caso, a Terceira Câmara Cível considerou que o paciente é pessoa vulnerável em relação ao hospital, especialmente pela complexidade técnica das provas relacionadas à prestação de serviços de saúde. O relator destacou que o hospital, como fornecedor de serviços, possui melhores condições de comprovar a regularidade dos procedimentos realizados, enquanto o paciente enfrenta dificuldades evidentes em reunir provas técnicas que sustentam suas alegações.
Contexto jurídico
Ó arte. 373, § 1º, do CPC/2015, permite ao juiz redistribuir o ônus da prova de forma a garantir o equilíbrio processual, principalmente em situações onde uma das partes possui acesso privilegiado a informações e recursos técnicos indispensáveis à elucidação dos fatos. A interpretação do dispositivo é essencial para garantir o direito de defesa e o acesso efetivo à justiça, especialmente em casos que envolvem pacientes em situação de vulnerabilidade em relação a hospitais.
De acordo com a decisão do Colegiado o que se verificou, concretamente, é que a inversão do ônus da prova fora imperioso no caso examinado, dada a hipossuficiência do paciente em relação ao hospital, sendo pertinente a demonstração dos dados para a devida análise do nexo de causalidade entre fato/dano e consequente estabelecimento ou não do direito requerido.
No caso concreto o Estado havia resistido a opção pelo uso da distribuição dinâmica das provas, defendendo que ao autor incumbiria o dever de provar o dano, o nexo causal e o resultado. Cuidou-se, entretanto, de apenas examinar a possibilidade do uso, pela máquina judicial, de medida cautelar, em atendimento ao direito da parte hipossuficiente para que pudesse enfrentar pontos urgentes na tramitação do processo.
Agravo de Instrumento nº: 0800100-94.2024.8.04.0000