
A evolução digital, olvidando seus inúmeros benefícios, trouxe também males resultantes desse processo, dentro os quais a propagação do ódio, ocasionando crimes como o de racismo. Embora a Lei 7.716/89 que define o crime de racismo não disponha expressamente sobre a punição para a prática de condutas homofóbicas e transfóbicas, há interpretação do STF que dispõe, até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional, a prática se ajusta ao racismo quando houver aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém. O tema abriu divergência no Conselho da Magistratura do TJMG quanto a questão da competência para o processo e julgamento do feito, oriundo por notícia de fato ao Ministério Púbico Federal, que declinou de suas atribuições por entender que a Justiça Comum caberia o processo e julgamento da causa.
Na Central de Inquérito de Minas, dada vista ao Ministério Púbico atuante na Vara, o Promotor de Justiça inferiu que os autos deveriam ser encaminhados à Justiça Federal, e fundamentou que o caso se cuidava de injúria homofóbica perpetrada pelas redes sociais, por se detectar ato injurioso que chamava a competência de conduta internacionalizada. O magistrado discordou da posição do Promotor de Justiça.
O Promotor de Justiça, sustentou, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, através da ADO 26/DF, equiparou atos homofóbicos com o delito de Racismo, o qual, por sua vez, é objeto da Convenção Internacional sobre a eliminação de todas as formas de Discriminação Racial, ensejando, por consequência, a atração da competência da Justiça Federal.
Insistiu que houve três requisitos cumulativos para a definição da competência da Justiça Federal, no caso de crimes praticados pela internet, assim descritos: ¹ o fato está previsto como crime em tratado ou convenção; ² o Brasil é signatário de compromisso internacional de combate à espécie delitiva e ³ existiu uma relação de internacionalidade entre a conduta criminosa praticada e o resultado produzido ou que deveria ter sido produzido.
O magistrado, no entanto, sustentou que a vítima era determinada, e não cabia a competência da justiça federal e insistiu em vista ao Ministério Público para se posicionar. O Promotor interpôs correição parcial, e os autos transbordaram no Conselho de Magistratura para evitar possível erro de procedimento.
Contudo, no mérito se examinou o fundamento do Ministério Publico Federal, com base no enunciado 51 da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Publico Federal: ” A persecução penal de crime contra a honra, cometido entre particulares, ainda que praticado por meio da internet, não é de atribuição do Ministério Público Federal”. Ocorre que o Promotor de Justiça insistiu em que houve comentários de que “homossexuais se constituem em aberração”, e o Brasil é signatário de tratado que visa eliminar toda forma de discriminação racial.
A decisão atacada, em concordância com o MPF firmou que não esteve presente o requisito da transnacionalidade, não bastando a potencialidade do dano internacional, daí, não haveria remessa a justiça federal. A correição parcial foi negada, e se concluiu, que, indiretamente, o Promotor de Justiça estaria pedindo o denominado “arquivamento indireto”, e se determinou a remessa dos autos ao Procurador Geral de Justiça de Minas.
Processo nº Correição Parcial 0768602-33.2021.8.13.0000 MG