Gata, vítima de maus-tratos, deve ser parte em ação sobre reparação de danos contra clínica, diz Juiz

Gata, vítima de maus-tratos, deve ser parte em ação sobre reparação de danos contra clínica, diz Juiz

Em um avanço no reconhecimento jurídico dos direitos dos animais, o juiz Regis Adil Bertolini, da 2ª Vara Cível de Santa Maria (RS), admitiu a inclusão de uma gata, Cacau, como parte autora em uma ação judicial contra uma clínica veterinária. O caso gira em torno de alegados maus-tratos sofridos pela gata durante um procedimento de castração realizado em maio do ano passado.

A ação, proposta por Cacau, representada por sua tutora, busca reparação por danos morais e materiais. A decisão, embora polêmica, reflete uma tendência crescente na jurisprudência brasileira de ampliar a proteção jurídica aos animais domésticos, reconhecendo-os como titulares de direitos, especialmente em situações que envolvem sua dignidade e bem-estar.

O Caso de Cacau
Cacau foi submetida a uma cirurgia de castração em uma clínica veterinária no Rio Grande do Sul, mas o pós-operatório revelou complicações graves. Segundo relato da tutora, a gata apresentava falta de apetite, fraqueza extrema e pupilas dilatadas, sinais que foram inicialmente tratados pela clínica como “normais”.

Nos dias seguintes, o quadro clínico de Cacau se agravou significativamente, levando a tutora a buscar atendimento em outra clínica veterinária. Os novos exames identificaram uma infecção severa no local da cirurgia, com tecidos em estado de necrose e alterações nos níveis sanguíneos. Além disso, foi diagnosticada insuficiência renal crônica, possivelmente desencadeada pela falta de anestesia adequada durante o procedimento ou pela contaminação do local cirúrgico.

Atualmente, Cacau enfrenta uma rotina intensa de cuidados. Ela realiza terapias semanais, faz uso de medicamentos de alto custo e necessita de uma dieta especial para controlar os efeitos da insuficiência renal.

 Na decisão que acolheu a legitimidade ativa de Cacau, o juiz Regis Adil Bertolini ressaltou que o caso não se limita à questão probatória, mas envolve diretamente os direitos de um ser sensível. O magistrado destacou: “A ação de reparação de danos trata de alegados maus-tratos vivenciados pela autora não-humana em procedimento cirúrgico, representada por sua tutora. Assim, verifica-se ser cabível o reconhecimento da legitimidade ativa da coautora-não humana.”

O entendimento reflete um debate crescente na sociedade e no meio jurídico sobre a capacidade dos animais de serem reconhecidos como sujeitos de direitos. Casos como o de Cacau impulsionam discussões sobre a necessidade de adaptar o Direito às demandas contemporâneas de proteção animal.

Implicações da Decisão
A inclusão de animais como partes processuais em casos de maus-tratos ou negligência não apenas reforça a importância do bem-estar animal, mas também desafia as estruturas tradicionais do Direito Civil, que historicamente os tratava como objetos de propriedade.

Embora a decisão não represente um consenso jurídico, ela reflete uma tendência que encontra respaldo em legislações de proteção animal, como a Lei nº 14.064/2020, que endureceu as penas para casos de maus-tratos a cães e gatos. Além disso, decisões semelhantes em outros estados sugerem que a jurisprudência caminha para um maior reconhecimento dos animais como seres capazes de titularizar direitos fundamentais.

A Luta por Justiça para Cacau
A tutora de Cacau, afirmou que o caso expõe a necessidade de maior rigor nos procedimentos veterinários e na responsabilização de profissionais em situações de negligência.

“Cacau não é apenas uma prova em um processo. Ela é a vítima, um ser que sofreu e ainda sofre as consequências de uma conduta inadequada”, disse.

Se a Justiça decidir a favor da gata e de sua tutora, o caso pode estabelecer um precedente significativo para a proteção jurídica dos animais no Brasil.

Reflexão sobre o Tema
Enquanto o ordenamento jurídico ainda debate os limites e alcances da capacidade jurídica de animais, o caso de Cacau ilustra uma mudança de paradigma. Ao considerar que animais não são meros bens, mas sim seres sensíveis, o Judiciário dá um passo importante no reconhecimento de que o direito à vida digna e à integridade se aplica a todas as espécies.

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