A presença de laços familiares entre as partes do processo faz configurar a existência de uma relação que suplanta a relação empregatícia, qual seja a advinda dos laços decorrentes do amor, solidariedade e colaboração que habitualmente existem entre aqueles que pertencem à mesma família e que os leva ao cuidado e amparo mútuos. Com esse entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-GO), negou, por unanimidade, o vínculo de emprego que uma aposentada de Guapó (GO) pretendia obter em relação aos seus irmãos, após cuidar de seu pai doente por quase três anos.
Para a relatora do recurso, desembargadora Iara Rios, ante o vínculo familiar, está ausente a presunção de que a prestação de serviços entre eles se dê na forma de contrato de trabalho. Nesse caso, caberia à filha cuidadora a prova de todos os requisitos do vínculo de emprego, o que não foi reconhecido no juízo de primeiro grau.
Entenda o caso
A filha de um idoso residente na zona rural de Guapó acionou a Justiça do Trabalho para obter o reconhecimento de vínculo de emprego com seus irmãos. A senhora alegou que os familiares a contrataram como cuidadora de seu genitor em outubro de 2019 para o período noturno com remuneração mensal de R$1.500,00. A mulher afirmou que, apesar do combinado com seus sete irmãos, foi contratada sem anotação na sua CTPS e ficou por conta dos cuidados com o pai até ele falecer, em junho de 2022, sem receber as verbas trabalhistas pertinentes. Requereu o reconhecimento da existência de vínculo empregatício com os irmãos, bem como o pagamento de todas as verbas inerentes ao contrato de trabalho.
Tarefas divididas
Os irmãos negaram a existência de vínculo de emprego com ela. Alegaram que pela redução de sua capacidade física, o genitor doou parcela de terra para cada um dos filhos e que, por isso, boa parte deles permaneceu próxima à sede da fazenda com tarefas divididas nos cuidados prestados ao pai ou a seus negócios, como a propriedade, o cuidado com o gado, compra de insumos, dentre outros.
Ao analisar os depoimentos e as provas apresentadas no processo, o juízo da 17ª Vara do Trabalho de Goiânia entendeu que, embora postulado o reconhecimento do vínculo de emprego face aos sete irmãos, a autora declarou em depoimento que o ajuste foi firmado com dois deles. Para o magistrado, não há prova de que os irmãos apontados como contratantes diretos possuíssem poderes de representação para firmar o pacto laboral em nome dos outros irmãos. Além disso, o pai, embora necessitasse de cuidados, era pessoa capaz, possuía renda própria e dele advinham os valores recebidos pela filha. O juiz também apontou que todos os filhos se empreendiam nos cuidados ao genitor, mas que a autora, recebia por tal função, por ser “sozinha” – expressão utilizada por ela em seu depoimento.
Falta de subordinação jurídica
O juízo negou o vínculo à mulher e ressaltou que embora ela recebesse determinada quantia em retribuição aos cuidados ao pai, não se vislumbra no processo traços de subordinação jurídica entre ela e os irmãos. Para o magistrado, essa característica é fundamental ao reconhecimento da relação de emprego. “Em regra, o que se espera, é que os filhos cuidem dos pais, nada obstando que haja uma colaboração mútua, ainda que de ordem financeira. O que se verifica é o cumprimento de dever de ordem moral e não contratual”, observou. Finalizou a sentença apontando que “o ordinário se presume e o extraordinário se prova”.
A sentença foi mantida e os pedidos foram julgados totalmente improcedentes.
Processo 0010794-37.2022.5.18.0017
Com informações do TRT18