A 6ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina condenou uma empresa de armamentos a pagar R$ 400 mil, a título de dano moral, à família de um policial militar que morreu em serviço devido a um defeito na arma.
De acordo com os autos, no dia 21 de novembro de 2011, por volta das 17h, o PM fez uma abordagem de rotina em São José e, ao se “inclinar para pegar no chão a pochete do suspeito, sua pistola PT 100 .40 se desprendeu do colete balístico, caiu no chão, disparou e a bala acertou seu rosto”. Ele morreu na hora. A arma, segundo os autos, estava travada e a dinâmica do acidente foi filmada por uma moradora que assistia à atuação da PM.
A família do policial – ele tinha uma filha de um ano – ingressou na Justiça com pedido de indenização por danos morais e materiais contra a empresa e também contra o Estado de Santa Catarina.
O Estado apresentou contestação e arguiu, em preliminar, carência de ação por ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, disse que não há dúvida de que o policial foi atingido por disparo acidental da arma que portava em razão de falha grave na trava de segurança do equipamento. Acrescentou que isso poderia ter sido evitado caso o policial tivesse abotoado a arma no colete tático. Impugnou, um a um, os pleitos condenatórios formulados pelos autores.
Por sua vez, a empresa defendeu a inexistência de defeito de fabricação na pistola porque o sistema é dotado de mecanismo de segurança que só permite o disparo quando o gatilho é acionado. Ao final, impugnou os pedidos condenatórios formulados na peça portal.
Em 1º grau, o juiz afirmou que as provas coletadas, em sua integralidade, atestam a responsabilidade da empresa de armamentos porque “foi justamente a falha na pistola que ocasionou a morte do policial”. Ele fez questão de ressaltar que o ocorrido não é fato isolado no histórico da empresa. “São diversas as ocorrências noticiando a mesmíssima falha no armamento e que culminou, desta feita, em ceifar a vida de um policial catarinense”, destacou.
No entanto, segundo o magistrado, não houve responsabilidade do Estado nem participação de qualquer outro agente estatal no ocorrido. “O Estado licitou a aquisição do armamento, disponibilizou sua utilização aos servidores e realizou adequado treinamento”, disse. “Por isso”, pontuou o juiz, “no que tange ao Estado, não vislumbro qualquer responsabilização, razão pela qual a improcedência do pedido é medida que se impõe”.
Na sentença, ele condenou a empresa a pagar R$ 200 mil por danos morais e determinou o pagamento de pensão para a filha do PM – até ela completar 25 anos – e pensão aos pais em caráter vitalício ou até a data em que o agente completaria 65 anos.
Isso porque ficou provado, nos autos, que eles dependiam economicamente do filho.
Houve recurso de ambas as partes ao TJ. A família pleiteou o aumento da indenização e a empresa reafirmou que a culpa pelo acidente deveria ser atribuída exclusivamente ao policial porque ele manteve a arma no coldre com a presilha de segurança desabotoada.
“A perda de um ente familiar”, escreveu em seu voto o relator da apelação, “alcança todos os que mantinham laços de afeto com o falecido, em especial pais e filhos. A intensidade do abalo anímico está diretamente relacionada à proximidade familiar com o de cujus. Aos pais, a morte de um filho inverte a ordem natural das coisas, provocando sofrimento que, mesmo com o transcorrer do tempo, tenderá a deixar marcas indeléveis”.
Ele pontuou que o montante a ser pago a título de indenização por dano moral deve ser graduado tendo por norte as particularidades do caso concreto, a extensão do dano causado e a condição socioeconômica dos envolvidos, de forma que a verba não seja ínfima, para não representar ausência de sanção efetiva ao lesante, nem excessiva, a fim de evitar-se o enriquecimento sem causa, tudo orientado pelos vetores da ponderação e da razoabilidade.
O desembargador sublinhou que a ré é líder mundial na fabricação de revólveres e uma das maiores produtoras de pistolas do mundo, tendo lucrado no segundo trimestre de 2021, a quantia R$ 193,6 milhões.
Diante do caso concreto, concluiu, o valor da indenização pelo dano moral deve ser majorada para R$ 400 mil, sendo R$ 70 mil para a esposa; R$ 90 mil para cada um dos pais e R$ 150 mil, acrescida de correção monetária a partir do arbitramento, bem como de juros de mora (1% ao mês), estes a contar do evento danoso. Os valores da pensão foram mantidos.
Seu entendimento foi seguido de forma unânime pelos demais integrantes da 6ª Câmara de Direito Civil. O caso corre em segredo de justiça e ainda cabe recurso.
Com informações do TJ-SC